PINHEIRO NA DÉCADA DE 1950
Moema
de Castro Alvim
Até o início da década de 1950 os
pais pinheirenses preocupados com o futuro profissional dos filhos,
enviavam-nos para São Luis, para os estudos de segundo grau e universitários.
Nessa época funcionavam apenas os cursos de Direito, Farmácia, Odontologia,
Filosofia e Pedagogia, portanto sem a menor perspectiva para quem quisesse
cursar Ciências Biológicas, Medicina, Agronomia, Veterinária, Economia,
Administração, Engenharia ou mesmo Serviço Social e Enfermagem.
Sem pensionatos, pensões e
hospedarias confiáveis, esses jovens eram enviados para a casa de parentes ou
amigos e estudavam geralmente na Escola Técnica, Liceu Maranhense, Escola
Normal, Colégio São Luís, Ateneu Teixeira Mendes, Centro Caixeiral e Colégio
Rosa Castro. Os mais abonados eram matriculados em colégios que dispunham de
Internato, como o Colégio Santa Teresa, dirigido pelas Dorotéias e que só
recebia moças e o Colégio Maranhense dirigido pelos Irmãos Maristas.
Quem dispunha de mais recursos
enviava seus filhos para outras capitais, como Belém, Recife e Rio de Janeiro,
onde se formaram em Medicina os pinheirenses José Maria Abreu, José de Castro Gomes e
Carlos Paiva.
Outros jovens foram enviados para o
Seminário Santo Antônio, porém nunca chegaram a ordenar-se, como Fuad Amate,
Antônio Carlos Lobato e Aymoré de Castro Alvim ou para as Forças Armadas, sendo
a Marinha e a Aeronáutica, as mais procuradas. José Paiva, José Soares, Tarquínio
e Erasmo Leite, José Ribamar Lima, sendo que este último graduou-se em
Medicina.
Em 1946, com a chegada dos
sacerdotes italianos, Missionários do Sagrado Coração sob o comando do Prelado
Dom Afonso Maria Ungarelli, aumentaram as expectativas dos pinheirenses. No ano
seguinte foi instalado o Seminário São José, no qual os padres lecionavam:
Evangelho, História Sagrada, Religião, Latim, Francês, História, Geografia,
Matemática e Desenho. Lingua Portuguesa ficou sob a responsabilidade da prof.
Maria Fausta Carvalho Gomes, filha do Dr. Elisabeto Barbosa de Carvalho e
esposa do Sr. Francisco José de Castro Gomes, diretor do semanário “Cidade de
Pinheiro”. Em dois anos vinte e dois alunos
foram matriculados, entretanto em 1949 só três conseguiram concluir o Seminário
Menor, viajando em 1950 para Pirassununga (São Paulo), para completar os estudos
(Seminário Maior) os seminaristas Tomaz Beckman, Antônio Carlos Ribeiro e
Geraldo Lima Silva. Entre 1950 e 1951 foram enviados para São Paulo, Antônio
Carlos Beckman, Almir Lima Silva e Lourenço Costa. Em agosto de 1951 o
Seminário encerrou suas atividades, tendo funcionado quatro anos e meio. Do grupo de seminaristas
ordenaram-se apenas os Padres: Tomaz Beckman, Antônio Carlos Ribeiro e os
irmãos Geraldo e Almir Lima Silva.
Em 1950 foi criada a Escola
Paroquial Nossa Senhora do Sagrado Coração e que funcionava na Praça da Matriz,
na casa que pertencera ao Sr. Armindo Campos. Atendia jovens de ambos os sexos,
em turnos diferentes, da primeira à terceira série do Curso Primário. As
professoras eram moças católicas residentes no bairro da Matriz: Dilu Freitas,
as irmãs Cici e Nenem Amorim, Maria Costa, Odalva, Zuila Corrêa, Terezinha
Ramalho. Mais tarde,numa das dependência das casas das freiras, foi aberto o
Jardim de Infância sob a responsabilidade de Lucy Soares.
Sob a coordenação de Dom Afonso, e
com as providências tomadas pelo deputado Costa Rodrigues, atendendo aos apelos
dos pais pinheirenses, foi instalado em 19 de março de 1953 o Ginásio
Pinheirense para receber estudantes de todas as paróquias que faziam parte da
Prelazia de Pinheiro. Para alcançar tal objetivo o Prelado conseguiu a
colaboração da Congregação do Sagrado Coração que enviou no início de 1953,
cinco religiosas, oriundas de Alfenas e Divinópolis, Minas Gerais, e que seriam
as professoras das moças: a Madre Dolores, a Superiora, e as irmãs Suzana,
Geralda, Felícia (enfermeira) e Adélia (cozinheira). Irmã Vera Maria chegou
depois. O hábito era branco com um coração de celulose emoldurando o rosto. Em
dias de festa o traje era preto.
As freiras foram instaladas na casa
que pertenceu ao Sr. Agostinho Marques, casarão que já havia sido adquirido
pelos padres e onde funcionara o Seminário. No convento, além da capela e da
clausura, as Irmãs mantinham um Internato e semi-Internato para as moças. Os
rapazes provindos do interior eram aceitos no Patronato São Tarcísio, que
funcionou antes da construção do prédio de três pisos, ao lado do sobrado dos
Padres, adquirido do Sr. Américo Gonçalves, na casa que pertencera ao Sr.
Raimundo Pinheiro. O Sr. Napoleão Cardoso e Silva, veio de Guimarães
exclusivamente para cuidar dos residentes. Os cursos preparatórios para o Exame
de Admissão ficaram sob a responsabilidade de uma das poucas professoras
normalistas disponíveis e competentes, Prof. Terezinha Leite Guterres,
professora da quinta série da Escola Paroquial, que fez a revisão dos conteúdos
de todo o curso Primário, pois muitos já o haviam concluído há alguns anos. Além
de d. Terezinha havia outras normalistas na cidade, porém não aceitaram essa
tarefa por terem seus encargos nas escolas onde eram alocadas: Profs. Maria Fausta,
Maria Quitéria Cerveira, Naly Cerveira Durans, Maria Vitória Caldeira Leite, do
Grupo Escolar Odorico Mendes e a prof. Neuza Berredo, diretora do Grupo Escolar
Elisabeto Barbosa de Carvalho. As outras professoras dessas duas escolas e das
demais existentes na cidade eram leigas.
Após a aprovação no Exame de
Admissão, rigorosíssimo, criaram-se duas turmas: uma de rapazes que estudariam
à tarde e a das moças no turno matutino. A cor do uniforme escolhida era cáqui:
as moças de saia e blusa com bolso bordado
com o monograma do Ginásio (GP), sapatos e meias pretas. Os rapazes de calça e
camisa cáqui; complementando as fardas de ambos os sexos, uma gravata preta.
O Ginásio funcionaria na antiga casa
do Sr. Josias Peixoto de Abreu, grande, confortável, adquirida em 1951 e já
usada para as últimas séries do Curso Primário.
Não sei, ao certo quantos alunos
foram aprovados. Lembro-me apenas de Francisco Reis Castro (Tinche), os irmãos
Inácio e Congo, Valter Peixoto (Vavá), Josué Santos, Josué Azevedo, Antônio
Alberto Barreto (Bequinho), Benedito Santos, Erasmo Pimenta, Antônio Sá (Totó),
José Pinheiro, Edmar Abreu, estes com idade superior a vinte anos. Mais jovens:
Francisco Leite Filho (Leitinho), Danilo Serra Durans, José Soeiro, William
Pinheiro, Carlos Alberto Barreto (Barretinho), Adonias Dias, José Carlos
Rodrigues, Roberval Melo que tiveram como professores Padre José, também
Diretor, Frei José, Pe. Lourenço, d. Terezinha Leite, Dr. Guerreiro, juiz; mais
tarde d. Terezinha Bittencourt Rodrigues, d. Marita Gonçalves, d. Amália Damous.
Dentre as moças, algumas por lecionarem
na Escola Paroquial no turno matutino, freqüentariam as aulas vespertinas com
os rapazes: Cici e Nenem Amorim, Maria Regina Durans, Dilu Freitas, Odalva e
Marieta Sá.
As jovens aprovadas e que estudariam
pela manhã eram; Honorina Sarges, Maria de Jesus Beckman (Bubu), Maria
Conceição Fernandes (Concita), Isis Franco de Sá, Nair Amate, Leyr Amorim,
Maria Helena Soares, Marilene Soares, as irmãs Castro, Maria da Graça, Maria do
Socorro e Maria Lúcia, Elcimar Cordeiro, Leonor Frazão (Lili), Ajur, Deny Leite,
Edna Pinheiro, Maria do Socorro Marques, Eliane Costa, Deusdedith Diniz, Zete e Dilucinda Castro.
No ano seguinte (1954) foram
aprovados: Afonso Guimarães, Alaor Mota, Rufino Fernandes, Remy Trinta, os
irmãos Cordeiro Rui e João Damasceno, José João Nogueira, Eldonor Cunha e as moças: Romélia
Cordeiro, Lenir Dias, Maria de Jesus Nogueira, Maria de Jesus Ferreira,
Terezinha Leite, Maria da Glória Costa, Maria de Jesus Cantanhede (Kiki), Flory
Moraes, Helinice Costa, Maria do Socorro Soares, Maude Cabral.
As disciplinas eram: Latim, Português,
Francês, Inglês, Matemática, Ciências, Geografia, História, Desenho, Canto
Orfeônico, Trabalhos Manuais e Religião.
O Latim era o algoz dos alunos e
logo no segundo ano reprovou Flory e Helinice que integrariam a terceira turma,
da qual fiz parte. Não tenho certeza do número de alunos que começou em 1955:
lembro-me de Edméa Machado Carvalho, vinda de Rosário, Niedja Serra Durans, de
Barra do Corda, Maria Alice Santos, Inácia Lima e e Silva, Maria Isabel Corrêa,
Marlinda Durans, Terezinha Durans, Maria Luisa Mineiro, Almerinda Weba
Guimarães, Maria do Socorro Matos, Maria do Socorro Santos, Magnólia Mendes,
Dilma Leite e eu.
Quanto aos rapazes, também não me
lembro de todos. Carlos Corrêa transferido para o Rio de Janeiro antes do terceiro
ano. Os demais eram: Adão da Costa Amorim, Eliézer Carneiro Gonçalves, Ernaldo
Beckman Peixoto, Gladston Pereira, João Quadros, Leudimar Ribeiro, Lauro Castro
Reis, José Isaias Ferreira, José Maria Santos, José Reinaldo Soares, Raimundo
Quadros, Nemer Damous, Reginaldo Costa Soares e Tarcísio Schalcher que logo apelidamos de “va
checher”.
Estávamos eufóricos, pois o uniforme
caqui havia sido substituído por um mais elegante, constando de saia pregueada
e gravata azul marinho, de casimira ou tropical inglês (mais tarde substituido por tergal), blusa branca de manga curta, de tricoline, com o monograma bordado no
bolso, sapato preto, meias brancas ¾.As turmas distinguiam-se umas das outras
pelo número de dragonas na gravata feitas com sutache branco, também chamado cauda de rato. Para os rapazes
calças e gravata azul marinho, camisa branca, de mangas curtas.
Além desse uniforme foram
requisitadas uma farda de gala, com saia pregueada feita de um tecido de seda parecido com tafetá, blusa de mangas compridas de lingerie e
boina brancas e gravata-borboleta preta; a farda para Ginástica,
saia-calça azul, sapatos de tênis.
As matérias com os respectivos
professores eram: Latim com Pe. José; Português e Matemática com Irmã Ruth que
havia chegado no ano anterior em substituição à sua mana Irmã Vera Maria; Francês,
Inglês e Religião com Irmã Suzana, História e Trabalhos Manuais com Irmã
Geralda; Canto Orfeônico com Frei José e Geografia e Desenho com Irmã Ana
Maria, recém chegada. Às quinta-feiras tínhamos sessões de declamação, quando
decorávamos algum poema, geralmente de Raimundo Corrêa, Bernardo Guimarães, Olavo
Bilac, Castro Alves, Gonçalves Dias, Camões. Aos sábados saíamos mais cedo, mas
antes a Madre Dolores ou Irmã Ruth nos davam informações sobre Civilidade e Boas
Maneiras. O único professor não religioso era o sr. Antônio Carlos Guterres,
professor de Educação Física, cujas aulas eram dadas às terças e quintas feiras
no pátio interno do convento das freiras. Corrida, agachamento, movimentos de
pernas e braços, pequenos saltos e equilíbrio num cavalo de pau. Também treinávamos
voleibol, aprendendo a fazer saque, driblar as adversárias, manter e defender a
bola nos passes, armar as jogadas, levantar a bola, cortar junto à rede. As
disputas eram realizadas com outras turmas, geralmente nos feriados. Próximo à
data da Independência o ritmo dessas aulas aumentava, quando ensaiávamos marcha cadenciada acompanhada pela banda de
música do colégio.
No início do primeiro semestre desse
ano, o Ginásio foi sacudido com a dispensa da turma de rapazes que estava
começando o terceiro ano. Uma troca de palavras desrespeitosas da parte de
alguns alunos, e o destempero por parte de uma professora que deu o ultimato
“ou eu ou eles” e da arbitrariedade do Diretor, resultaram num processo
desnecessário e intempestivo, suspendendo toda a turma vespertina, exceto as
moças que faziam parte dela, com comissão investigatória, depoimentos secretos,
após o que foi instaurado um inquérito, cujo desfecho foi a suspensão doas
alunos: “ ...os professores se recusam em continuar dando aulas...E não havendo
outros professores habilitados para substituí-los, é a nossa decisão, aqui,
fechar o funcionamento da terceira série ginasial para o resto deste ano
escolar.”
Alguns falaram em expulsão. O certo
é que Francisco Castro, Josué Santos, Josué Azevedo, Benedito Santos, Danilo,
Leitinho, Zé Soeiro, José Carlos Rodrigues, Vavá Peixoto, Totó Sá, Roberval
Melo, Congo e seu irmão Inácio, Adonias, William Pinheiro, Bequinho e
Barretinho, Edmar, Erasmo Pimenta jamais voltariam a estudar no Ginásio Pinheirense,
apesar dos apelos dos pais e intermediários, junto à direção do Ginásio. Foi graças
ao empenho desses pais junto aos amigos políticos, cujos filhos foram expulsos,
que Pinheiro contou com o primeiro Ginásio da Baixada.
Da turma duramente penalizada,
alguns cujas famílias tinham recursos foram para São Luís; desses apenas três fizeram
um Curso Superior: José Carlos - Medicina em São Luís; Adonias - Engenharia em
Belém; Leitinho - Farmácia em Belém; Vavá foi para Recife por conta do Pastor Fred Fuller da Igreja Batista para cursar
Teologia; outros fizeram Contabilidade no Centro Caixeiral em São Luís como
Danilo, Tinche, Roberval, William e José Pinheiro. Outros fizeram o Científico
no Colégio São Luís, graças à solidariedade do proprietário Prof. Luis Rego, casado
com uma pinheirense, que os recebeu em pleno período escolar. Edmar foi
trabalhar na Loja Imperatriz, Benedito Santos ficou trabalhando nas Organizações
Albino Paiva, em Pinheiro. Inácio e Congo, Totó, se dedicaram a outras
atividades, assim como Josué Azevedo e Josué Santos que vieram para São Luis.
José Soeiro nunca se recuperou desse golpe que pôs por terra seus sonhos e
planos de futuro.
Mesmo nesse clima de constrangimento
e aversão aos métodos didáticos do Diretor Pe. José, extrapolando as normas de
bom-senso e convivência em uma cidade onde aportaram há menos de dez anos,
alimentando hostilidades acirradas pelo tenente Oli de Castro, diretor de um
Centro Espírita que deflagrou uma demorada polêmica com os padres, o ano de
1955 transcorreu sem maiores incidentes. No fim do ano, para deixar impressa a
sua didática pouco ortodoxa, o Pe. José reprovou vários alunos das três séries,
resultando no abandono dos estudos, por parte de alguns; outros pediram
transferência, poucos repetiram o ano, sendo absorvidos pela turma seguinte.
Perdemos Marília, Helinice e Dilma
Leite que foram transferidas para São Luís; Edméa, Socorrinho Matos, Marizinha
e Magnólia, por reprovação em Latim. Ganhamos Flory, da turma anterior e Maria
Benedita Moraes (Bibi), procedente de Ararí.
Para acalmar os ânimos e dar uma
satisfação aos pais de alunos reprovados, Dom Afonso transferiu o Pe. José para
Fortaleza, substituindo-o em suas funções de Diretor do turno vespertino e professor
de Latim, pelo Pe. Sandro Fedele, recentemente vindo de Roma.
Até a segunda série as aulas eram
ministradas no prédio adquirido do Sr. Josias Abreu à rua Luis Domingues, após as necessárias ampliações e adequações.
Nesse prédio também funcionava algumas salas de aula da Escola Paroquial, sendo
o portão de entrada situado na rua lateral, atualmente Rua Josias Abreu. Na terceira série fomos transferidos para salas recém construidas,
em comunicação com a sede antiga, com entrada pela Avenida Vitorino Freire,
atualmente Presidente Dutra.
As aulas começavam, pontualmente, às
8:00h, após a chegada das Irmãs acompanhadas pelas internas, em fila, do
convento ao colégio. Quinze minutos antes o sino tocava, para perfilar-nos no
pátio, cantar um hino que podia ser o Hino Nacional, Maranhense, da Bandeira e
até do Vaticano. Depois das orações de praxe, ou de algum aviso coletivo
adentrávamos nas salas, em silêncio, sem aquele alarido que se espera de
adolescentes. Após a chamada, as aulas começavam. Tínhamos três, às vezes quatro
aulas diárias, com duração de quarenta e cinco a sessenta minutos. No intervalo
às 9:30h íamos para o pátio, em recreio. Algumas traziam lanches de casa, outras
compravam numa cantina improvisada por d. Dulce Ribeiro, a vigilante.
Aproveitávamos para ir à casinha (banheiro) e tomar água, pois não era
permitida a saida, durante as aulas. Nesses quinze minutos, à sombra das
mangueiras, aproveitávamos para atualizar as fofocas e marcar compromissos,
geralmente em pequenos grupos. Às 11:30h o sino tocava, anunciando o fim do
turno.
As disciplinas que faziam parte da
grade curricular com os respectivos professores eram: Português e Matemática
com Irmã Ruth; Geografia e Desenho com Irmã Ana Maria; História e Trabalhos
Manuais com Irmã Geralda; Francês, Inglês e Religião com Irmã Suzana; Latim na
primeira série com Pe. José, substituído por Pe. Sandro; Canto Orfeônico com
Frei José.
Os rapazes, com aulas no turno
vespertino, tinham como professores, além dos padres, pessoas da comunidade
como o juiz de Direito Dr. Guerreiro, as Profs. Terezinha Leite, Terezinha
Bittencourt Rodrigues, Amália Damous, Marita Gonçalves.
METODOLOGIA
As aulas de Geografia e História
eram expositivas, sendo as de História apoiadas por textos atualizados como se
fossem reportagens de época: Tratado de Tordesilhas, D. Manuel, o Venturoso,
grandes descobrimentos, caminho marítimo para as Indias, primeiras expedições
colonizadoras, capitanias hereditárias, Governos Gerais, guerras púnicas,
Aníbal,Dario, Alexandre - o Grande, Átila, rei dos Hunus, Júlio César, Napoleão,
primeira e segunda guerras mundiais e eram de fácil compreensão, por esse
método. Irmã Geralda se transfigurava nessas aulas, contagiando-nos com o seu
entusiasmo. Chegava a ficar corada, ela que era naturalmente pálida. Magra,
estatura mediana, olhos escuros.
Nas aulas de Geografia, Irmã Ana
Maria, trazia mapas, globo terrestre, figuras com os principais acidentes
geográficos: os grandes rios e seus afluentes, cadeias de montanhas, serras,
picos culminantes, ilhas, arquipélagos. Aprendíamos sobre latitude, longitude,
fusos horários, meridianos, paralelos. Meios de transportes, produtos de
exportação da pecuária, agricultura, população, etnias. Essa Irmã era branca,
olhos escuros, usava óculos de lentes escuras; de baixa estatura e um pouco
tímida.
As aulas de Ciências, a partir da terceira
série com Irmã Paula, eram auxiliadas por posters dos vários grupos de animais
vertebrados e invertebrados, estudados em Biologia. Em Botânica estudávamos as
plantas simples, compostas, monocotiledôneas, etc. Também levávamos folhas
colhidas em casa, para saber se eram grandes, pequenas, digitiformes,
lanceoladas, serrilhadas, lisas, com pêlos, verde bandeira, verde limão,
verde-amarelada, verde-folha. As flores eram dissecadas para aprendermos os
tipos de pétalas, androceu, gineceu, simples, compostas e tipos de frutas e
sementes. Fazíamos, também, alguns experimentos como acompanhar a germinação de
um grão de feijão, enxertia e outros tipos de reprodução e cultivo. Talvez
tenha surgido nessas aulas o desejo de cursar Biologia ou outro ramo onde
fossem estudados os seres vivos. Irmã Paula era alta, olhos esverdeados, usava
óculos, forte e muito corada. Não gostava de brincadeiras em suas aulas.
Nessas disciplinas as avaliações
eram baseadas em notas de argüição durante as aulas, na prova escrita com uma
dissertação e mais dez questões, somadas à nota obtida na prova oral. O ponto
era sorteado antes das provas e, claro, não eram permitidas colas nem cochichos.
As aulas de Português com Irmã Ruth
constituiam a melhor parte da programação. O pouco que sei dessa disciplina
aprendi nessas aulas: palavras simples, compostas, primitivas, derivadas,
sufixos, prefixos, conjugação de verbos regulares, irregulares; pontuação; regras
de concordância, etimologia dos vocábulos; neologismos, análise e interpretação
de textos, de Os Lusíadas à letra do Hino Nacional, sujeitos ocultos,
predicados, complementos, sinônimos, antônimos, categorias gramaticais; biografias
dos grandes poetas e romancistas, suas obras. Irmã Ruth era alta, magra,usava
óculos, refinada e muito culta, talvez a mais preparada de todas. Ora era
suave, ora autoritária, sabendo impor moral na turma. Todos os alunos a
respeitavam.
A avaliação em Português também era
através de provas escritas e orais. A
redação tinha maior peso, além das indefectíveis dez questões.
Até o segundo ano tivemos aulas de
Matemática com Irmã Ruth, só Aritmética. A partir do terceiro, com Irmã Paula:
juros, frações, equações, regra de três, expoentes, decimais, numerais,
álgebra, geometria, rudimentos de estatística e de contabilidade. A lousa era
fundamental para melhor esclarecimento. Essas aulas eram complementadas por
problemas, geralmente levados pra casa, para resolvermos, alguns de difícil
solução. Às vezes íamos para a residência da colega Terezinha vizinha de
Inácia, ambas moradoras no bairro da Matriz e excelentes nessa disciplina.
Geralmente as provas orais
semestrais eram acompanhadas pela Madre Maria Dolores.
Os Trabalhos Manuais eram o meu
suplício, meu inferno particular. Verdadeiro pesadelo a minha falta de destreza
com as agulhas de crochê e tricô, as navetes do frivolité, macramê, as agulhas
de bordar ponto cheio, ponto atrás, de cruz, ponto aberto. Deus, como eu
detestava, tolerando apenas porque gostava muito da Irmã Geralda!
Desenho, também não era o meu forte.
Preferia os desenhos à mão livre, cujos temas ficavam à nossa escolha.
Geralmente desenhávamos flores, frutas como caju, pêra, cachos de uvas e
morangos e outras que não conhecíamos. Minha preferência recaia nas paisagens
bucólicas ou por uma ilha solitária, com dois coqueiros no meio da vegetação
rala, uma bonita lua e uns pássaros no céu que eu explicava tratar-se de
corujas. Já nos desenhos geométricos, barras gregas e colunas jônicas, feitas
com o uso de esquadro e régua; círculos usando o compasso, em todas eu era uma
negação, por mais paciência e explicações de Irmã Ana Maria.
Em Música gostava apenas de cantar;
sem ser desafinada tenho uma pequena extensão vocal. Ler as notas musicais,
claves, sustenidos, bemóis, meio-tons para solfejar, nunca aprendi, mas fui
selecionada como uma das cantoras, para integrar o coro da Igreja nas missas
solenes cantadas em Latim. A melhor parte eram os ensaios, as escolhas de quem
faria as primeira e segunda vozes, acompanhados pelo harmônio tocado por Frei
José, nosso professor de Música. De batina preta, sempre sorridente, óculos encobrindo
seus olhos verdes e cativantes, o Frei era amado e respeitado por todos os
alunos.
As aulas de Religião eram dadas por
Irmã Suzana que lia as parábolas do Novo Testamento e pedia-nos para
interpretá-las. Pecados mortal, venial, original, vícios capitais, assim como
os Mandamentos de Deus e da Igreja, os Sacramentos, dogmas, ritos, eram
explicados à exaustão. Das freiras, a Irmã Suzana era a nossa preferida:
brincalhona, arrancava-nos confidências sobre nossos inocentes namoros,
dava-nos conselhos. Bem morena, de óculos, loquaz, era a mais velha depois da
Madre Superiora. Era, também a professora de Francês e Inglês. Diziam que ela
não era expert nesses idiomas, mas dava as suas aulas direitinho: pronunciar as
letras do alfabeto, aprender a contar de 1 a 10, a 100, a 1000; versões,
traduções, conjugação de verbos, pronomes pessoais, demonstrativos e o mais
importante, aprendemos nossas primeiras frases: mon amour, my love, bonjour,
give me a kiss, I love you, au revoir, good bye, thank you, excuse me, mercy beaucoup,
comment allez vous, aujourdui e outras mais, que esnobávamos entre amigos, fora
das salas de aulas; estas eram alegres, participativas, interativas e não
sentíamos o tempo passar.
Na primeira série o Latim foi
ministrado pelo Pe. José. Vivíamos apavorados, com receio de cometer o menor
deslize que fosse interpretado como indisciplina, pois sabíamos da sua
intolerância já manifestada com a turma masculina da terceira série. Já
difícil, com a falta de empatia com o professor, o Latim constituia um
verdadeiro terror para os alunos. Nesse ano não foi diferente. Para deixar
patente a sua implacabilidade, o número de reprovações bateu recorde. Foi a
lembrança deixada pelo professor que seria substituído no ano seguinte, pelo
Pe. Sandro Fedele. Dom Afonso quisera, com essa atitude, evitar confrontos entre os pais dos alunos
reprovados e insatisfeitos e a intransigência dos métodos empregados pelo Pe.
José e que tiveram como resultado a fuga em massa dos católicos para as hostes
espíritas e para a Igreja Brasileira cujo padre Adolfo foi convidado pelo
arquiinimigo da Prelazia - Olí de Castro.
Com o Pe. Sandro, o Latim se tornou
palatável e digerível; ajudados pelas aulas de Português ministradas pela Irmã
Rute, pudemos aquilatar a importância dessa língua morta que deu vida a tantas
outras, inclusive ao nosso idioma, última Flor do Lácio, segundo Olavo Bilac.
Sempre de batina impecavelmente
branca, de tecido sintético, acho que nylon, alto sem ser musculoso, nariz
aquilino, era o típico romano, charmoso, educado, gentil, carismático, bonita
voz, sabendo lidar com os jovens de ambos os sexos, olhando-nos nos olhos.
Declinações, conjugação de verbos, traduções, versões, interpretações de textos
dos grandes poetas e escritores latinos eram ministrados num clima agradável
que prendiam a nossa atenção e despertavam o nosso interesse.
Embora nunca tenha incentivado a
criação de Grêmios Estudantis, o Padre Sandro soube aproximar-se dos jovens,
mantendo-os unidos, afastados da bebida e de outros vícios.
Cativando-nos, conquistou-nos
através dos esportes, principalmente o basquetebol e espiribol, salto à
distância, salto com vara, praticados pelos rapazes e o voleibol, pelas moças cujas
partidas festivas e animadas eram realizadas nas tardes dos feriados cívicos,
assumindo, geralmente as funções de árbitro.
Além dessa faceta, como excelente pedagogo,
adquiriu equipamentos para pingue-pongue, mesa de pebolim, jogos de dama e dominó,
reunindo os rapazes no mezanino do Auditorium, ainda em construção.
Aos domigos, após o almoço, as moças
iam para a casa das freiras jogar Quarteto e Dominó, enquanto Irmã Suzana dava
aulas de piano para Isis Franco de Sá e Maria Célia Azevedo. Os desenhos das
plaquetas dos dominós representavam grupos de vegetais da nossa flora com as
respectivas famílias, assim como os mais importantes grupos de animais da nossa
fauna, familiarizando-nos para as aulas de Ciências. Já o Quarteto era jogado
com lâminas ou cartas parecidas com as de baralho e tarô, só que continham
nomes e fotos de escritores, poetas, das várias Escolas e tendências,
compositores, escultores, pintores de várias nacionalidades; jogado em duplas,
ganhava a partida quem formasse o maior número de quartetos
Nessas tardes era-nos permitido o
uso da biblioteca do convento, uma vez que o Colégio não dispunha de biblioteca.
Os livros mais recomendados tinham fundo moral: Palavras à minha filha; Minha
filha entrou no mundo e outros do Padre Negromonte. Entretanto os mais
disputados eram Poliana menina, Poliana moça e os romances açucarados de José
de Alencar e Bernardo Guimarães. Também A moreninha, de Joaquim Manuel de
Macedo, Inocência de Visconde Taunay, O Ateneu de Raul Pompéia e Memórias de um
sargento de milícias de Manuel Antônio Almeida. Não havia romances de Eça de
Queiroz, nem de Júlio Diniz e Aluisio Azevedo, tampouco dos autores franceses.
Quando precisávamos fazer alguma
pesquisa, não encontrada em Seleções ou em outras revistas que meu pai tinha
assinatura, íamos para a casa de dona Amália Damous, uma das professoras dos
rapazes e que nos franqueava a sua biblioteca. Lembro-me apenas da coleção
Tesouro da Juventude, formada por 18 volumes com capa azul. E claro, tínhamos o
maior cuidado ao manuseá-los.
Mesmo nas aulas de Ciências não
estudávamos o aparelho reprodutor humano, ou quaisquer rudimentos de orientação
sexual.
Para compensar, voltavam nossas
atenções para outros aspectos da vida, incentivando concursos para elegermos a
mais gentil, educada e atenciosa, dentre as colegas. Na primeira vez Cici
Amorim ganhou, nos anos seguintes até formar-se votávamos em Ísis.
O Pe. Sandro, também estimulou a
criação da Pia União das Filhas de Maria da qual muitas de nós fizemos parte
(da nossa turma: Inácia, Almerinda, Marlinda e eu) e a Legião de Maria,
abrangendo quase todas as ginasianas, contagiadas pelo espírito religioso e cunho social dessas
ações. Quase todas o tinham como Diretor Espiritual e confessor.
No Carnaval, enquanto as colegas
caiam na folia, Almerinda, Inácia, Marlinda e eu, Filhas de Maria, fazíamos
Retiro Espiritual. Também não participávamos dos assaltos carnavalescos em
casas de amigos, mascarados, vestidos ou não com fofões; data dessa época a
minha aversão ao carnaval.
A fama do Ginásio era tão boa que
além de receber jovens dos vários municípios que integravam a Prelazia de
Pinheiro, como Turiaçu- Maria do Carmo Teixeira, Nemer Damous; Carutapera – Raimundo e João
Quadros; Cururupu- Mariinha e Maria de Jesus Cantanhede; Perimirim, Alexandre Botão; Santa Helena - João Jorge Pavão, os filhos dos
Srs. Ruy e Jayme Marques; Pedro Lobato e as filhas de Benedito Castro, de
Queimadas; Guimarães - Tarcísio Schalcher (Va checher); De São Bento,embora
não pertencesse à Prelazia de Pinheiro, vieram: Remy Trinta, Edna Pinheiro,
Maria Lúcia Vale e um rapaz de belos olhos negros a quem jogávamos chistes
quando passava por nós e tímido mascava chicletes, de nome Murilo Pinheiro e a
quem apelidamos de Mr. Chiclets. Também de Bequimão, Mirinzal, Bacuri,
Alcântara. De outros Estados em busca de uma educação para seus filhos, num bom
Ginásio de uma cidade em desenvolvimento mas ainda pacata, com excelente
qualidade de vida vieram: do Rio o Sr. Enoque Moraes com 4 filhos, sendo três
moças; um irmão do Sr. Pituca Gato com duas filhas, uma das quais Rosimary
namorou Hildebrando. De São Luís os irmãos Carlos Duval e Waldemiro, filhos do
Dr. Fernando Viana.O médico de Pinheiro nesses anos, trouxe três filhos de quem
nos tornamos amigos. Também e principalmente dos povoados-satélites vieram
jovens para o Ginásio: do Gama, os filhos do português Abílio Fernandes e o Sr.
Antenor Viegas com a filha; do Curralzinho as filhas do Sr. Marçal Fernandes;
de Entre Rios, os filhos do Sr. Zorobabel; da Ave Maria os filhos do sr. Ludgero Dias; do Pericumã as filhas do Sr. Ademar
Peixoto; do Burití os filhos do Sr. Simplício Ribeiro, inicialmente Aquiles
depois os outros; do Engenho Queimado as filhas de Raimundo Bittencourt; do
povoado São Luis, Lucenir, filha do Sr. Barnabé Sousa; de Ponta de Santana,
Mundiquinha Durans com as filhas; de Pacas, as irmãs do farmacêutico recém-graduado
Almir Silva Soares e Lavínia Amorim, da Enseada; de Ponta Branca, Bom-Viver;
Algenir Aguiar e os filhos, de Ibiratuba; José Castelo e os filhos, enfim de
quase todos os povoados de Pinheiro.
Os primeiros jovens hospedavam-se
com parentes, padrinhos, amigos. Com a chegada dos seus irmãos houve
necessidade de alojá-los em residências próprias,com mais conforto, havendo
premência na construção de novas casas.
As primeiras foram construídas nos terrenos baldios das ruas transversais do
centro da cidade. Com as novas moradias, foram expandindo-se os bairros da
Faveira, Matriz, Matadouro, Campinho, Beirada, Aeroporto, Sete, Alcântara. A Baixinha e a
Forgata foram aterradas. Houve necessidade de abrir novas ruas, começando a
surgir os sobradinhos e casas pequenas, fugindo ao estilo arquitetônico da
cidade. Abriram-se novas praças para lazer dos moradores.
A cidade se expandia, a população
crescia e as necessidades básicas aumentavam. A demanda maior do que a oferta
exigiu mudanças, principalmente no comércio. O Mercado Central foi ampliado com
a instalação de novos boxes higienizados para a venda de carnes, peixes,
verduras e frutas. A matança de reses e
porcos passou a ser feita diariamente. A população se tornou exigente e para
atendê-la foram abertas mercearias, padarias, lojas de tecido, armarinhos, bazares,
farmácias e pequenas vendas. As antigas renovaram os seus estoques para
enfrentar a concorrência. Abriram-se olarias para o fabrico de telhas e
tijolos. Postos médicos, novas capelas e até o cemitério foi ampliado. A cadeia
pública, em novas instalações na Praça do Cemitério fora transferida da casa
onde funcionou por décadas, no início da Rua Diogo dos Reis.
As praças receberam nova
arborização, assim como as antigas avenidas. Sumiram as carroças, os cavalos,
montarias do nosso homem do interior.
Os profissionais se multiplicaram e
se aperfeiçoaram para atender a nova clientela: sapateiros, costureiras,
bordadeiras, alfaiates, barbeiros. Também os marceneiros, pedreiros,
mestre-de-obras. Surgiram os técnicos de Contabilidade substituindo os antigos
guarda-livros, os delegados eram formados em Direito, médicos residentes, dentistas
formados em substituição aos práticos; advogados para substituir os
provisionados; normalistas; fotógrafos, técnicos em eletrônica, especializados
em rádio, aparelho de som, inclusive alto-falantes. E a chegada dos novos
veículos a motor. O prédio dos Correios e Telégrafo foi transferido para um
prédio próprio e amplo. O Estádio Costa Rodrigues também foi melhorado. E novas
escolas foram abertas.
Apesar do patente e inegável
progresso sócio-cultural, com reflexos na melhoria dos serviços oferecidos e no
setor urbanístico, repercutindo na economia de todo o município, muitos jovens
nunca quiseram submeter-se ao exame de admissão. Dentre eles: Selma Castro,
irmã do Ten. Olí, Niédice Soares, Alcinda (Cindoquinha) e Sofia Castro, Maria
do Rosário e Gilma Araujo, Valdeci Soares, Socorro Jinkings, Adelmira (Dezinha)
Peixoto, Isabel Reis, Maria de Luiz Santeiro, Yolete Soares, Valdecy Moraes, Socorro Moraes, Ana Fausta Pessoa, Maria de Jesus Mendes e muitas outras, cujos nomes não me ocorrem no momento.
NOSSA VIDA SOCIAL FORA DO ÂMBITO
ESCOLAR
E assim despreocupados e felizes
atravessamos incólumes o ano de 1955, cuja única novidade fora do âmbito
escolar fora a chegada na cidade de um circo. Formado por famílias, os seus
integrantes hospedaram-se na pensão de d. Loló Guterres ou alugaram casas, como
o Sr. Homero que além da esposa tinha dois filhos já exercendo as funções
circenses. Não lembro o nome do palhaço engraçadíssimo, pois nossa atenção era
voltada para a dupla de trapezistas, um dos quais de apelido Galego, mantinha-nos
em suspense durante suas acrobacias no trapézio. Havia um show-man que além de
atuar como ator em todos os dramas apresentados, cantava imitando cantoras
famosas e instrumentos musicais, apertando as narinas. Também era um excelente
declamador e fora do circo, quando o visitávamos em casa de d. Loló compunha
poemas de improviso com os temas que lhe dávamos. Esse poeta, Abílio da Silva
Loureiro, no ano seguinte casou-se com minha mãe, viúva do meu pai há quatro
anos.
No fim do ano, por causa de minhas
notas excelentes ganhei uma bicicleta Monark. Linda, com dois espelhos
retrovisores, selim com uma bonita capa alcochoada, com franjas, buzina e até farol. Um
charme! Passei os primeiros três dias montada voltando pra casa só para as
refeições e dormir. Mamãe, já arrependida e preocupada me mandou para São Luís.
Uns dois anos antes o Grupo dos
Gonçalves inaugurara o Cine-Teatro Pinheiro, no prédio da Associação, à Rua
Luis Domingues. O filme de estréia foi Ali-Babá e os quarenta ladrões em
cinemascope, divulgado por Bitola com o seu megafone e, também, através de
alto-falantes instalados no caminhão do Grupo. Tela grande na parede frontal do
palco, espaço amplo com poltronas individuais de madeira, projetor bem
distante, localizado numa câmara especial no mezanino onde, também funcionava
um serviço de alto-falante comandado por Byron Costa Ferreira.
As principais atrações eram os
filmes americanos de bang-bang, nos quais torcíamos pelos mocinhos: os mais
famosos eram Zorro e Tom Mix. Acompanhávamos as aventuras de Tarzán, do
Fantasma, de Mandrake e dos Três Mosqueteiros. Emocionávamos com o Conde de
Monte Cristo e os filmes sobre a Paixão de Cristo exibidos na Semana Santa. Não
perdíamos os mexicanos com muitas rumbas, mambos e outros ritmos caribenhos,
estrelados por Maria Antonieta Pons, Maria Felix, Ninon Sevilla, Ricardo
Montalban, Pedro Vargas, Gregorio Barrios, Augustin Lara e às vezes Libertad
Lamarque, estes últimos cantores. Imperdíveis mesmo eram os filmes românticos
nacionais estrelados por Fada Santoro, Anselmo Duarte, Cyll Farney, Eliane
Macedo, Ilka Soares, Adelaide Chiozzo e outros galãs e atrizes, acompanhados pelo acordeon
de Sivuca ou a sanfona de Luiz Gonzaga. Revoltávam-nos as maldades do rei do
cangaço, capitão Virgulino, o Lampião, cujo papel era desempenhado
magistralmente por José Lewgoy. Ríamos a
valer com as Chanchadas da Atlântida, comédias musicais com um humor ingênuo,
burlesco, geralmente satirizando ou debochando de um assunto atual e polêmico.
Traziam em seus elencos os cômicos: Oscarito, Grande Otelo, Ankito, Zé
Trindade, Zezé Macedo, Violeta Ferraz, Renata Fronzi, Sônia Mamede, Jece
Valadão, Vanja Orico. Os filmes mais marcantes foram: Amei um bicheiro, Matar
ou Correr, Carnaval no fogo, nem Sansão nem Dalila, De vento em popa, Rico ri à
toa, Aviso aos navegantes. Copiávamos os
modelos dos vestidos das atrizes e cantoras que passamos a conhecer: Emilinha,
Isaurinha Garcia, Nora Ney, Ângela Maria. Também são dessa fase os cantores
Jorge Goulart, Francisco José, Cauby Peixoto, Orlando Silva, Nelson Gonçalves.
Esperávamos, com ansiedade, a exibição do filme Sinhá Moça, baseada na obra
homônima de Maria Dezone Pacheco Fernandes, pois fora bastante elogiado pelos
que o assistiram em São Luis, frustrando-nos, pois a cópia que viera para
Pinheiro foi queimada.
O ano de 1956 entrou num clima de
muitas expectativas. Inicialmente com a possibilidade de termos petróleo em
nosso subsolo, chegou uma equipe de geólogos e engenheiros americanos, a
iniciar os trabalhos de prospecção e perfuração de poços o que fez com que o
custo de vida chegasse à estratosfera: o quilo de carne bovina e suína subiu,
galinhas, patos ou uma simples dúzia de ovos ficaram inacessíveis à população,
sem condições de adquiri-los com a nossa sempre desvalorizada moeda que não
podia competir com o estável dólar. Nesse período aprendemos o vocábulo
inflação. Aproveitando essa circulação de americanos na cidade, o casal Dico
Aroucha e Rosa, abriu um bar, bem em frente à nossa casa. Não me fartava em
saborear os picolés de coco, chocolate, leite, morango, maracujá, abacate. Quanto
aos sorvetes nunca conseguiram fazer tão saborosos como o Imperial, fabricado
por Tio Paulo no Bar Vitória.
PRIMEIRO
CENTENÁRIO DE PINHEIRO
Os preparativos para os festejos do Primeiro Centenário
da Emancipação Política de Pinheiro a ser comemorado no dia 3 de Setembro,
monopolizaram a atenção de todos os cidadãos: nas escolas, nos bares, nas
conversas dos cantos de ruas, portas das igrejas após as missas, na redação do
jornal “Cidade de Pinheiro” e principalmente na Câmara Municipal e na
Prefeitura, responsáveis pela formação da Comissão Organizadora das
festividades. À frente o Des. Elisabeto Barbosa de Carvalho, o Dep. Antônio da
Costa Rodrigues, o prefeito municipal Raimundo Celino de Araujo, o juiz Dr.
Antônio Guerreiro, Dom Afonso Maria Ungarelli, que não mediram esforços, viabilizando
verbas, solicitando ajuda da Associação Comercial do Maranhão, com a
intercessão do Sr. Salgueiro, para a construção de um obelisco, marca do
Centenário, construído na entrada da principal avenida da cidade, exatamente
onde a Rua Nova ou Vitorino Freire cruza com uma das mais antigas, a Rua Diogo dos Reis. Também
a viabilização de um livro constando das crônicas de autoria do historiador
Jerônimo Viveiros e que vinham sendo publicadas semanalmente em “Cidade de
Pinheiro”, Missa Solene Campal, Exposição do gado adquirido pelos pecuaristas
conterrâneos em Uberaba, para melhoramento genético do rebanho. Representações de
peças teatrais na Praça General Dutra, Exposição de Pinturas de artistas
maranhenses consagrados, um grande banquete seguido por um Baile de Gala, para
recepcionar os convidados ilustres e o mais importante e imorredouro, o Hino Oficial
de Pinheiro. Para esta última providência foi requisitado o Pe. Pedro Tiddei
que além de competente professor de Literatura Românica do curso de Letras da
Faculdade de Filosofia, era excelente musicista. Falava-se até na possibilidade
da vinda do Presidente Juscelino Kubitscheck.
Desde o início do semestre começaram
os ensaios do Hino do Centenário, cuja letra com oito estrofes não fora fácil
de aprender. Também os ensaios para as comédias sob a direção da Dra. Maria Úrsula
Ewerton dos Santos; do coro falado e cantos gregorianos para a Missa Campal,
dirigidos pelo Pe. Sandro e a marcha para o desfile cívico, sob a
responsabilidade do prof. Antônio Carlos Guterres.
Para tornar a cidade mais bonita o
prefeito mandou podar os Ficus benjamin que arborizavam nossa principal avenida
e as praças da Matriz e Presidente Dutra, plantadas na administração do
prefeito Josias Abreu, em 1921. O jardineiro não devia ser especialista nesse
tipo de árvores, pois cortou demais, deixando só os troncos: perdemos a beleza
das árvores à sombra das quais conversávamos com os colegas nas tardes de
sábado e nos domingos, durante as férias. A cidade ficou nua e todos nós
revoltados com o prefeito Dico Araujo a quem nunca perdoamos, pois essa
arborização era motivo de orgulho para nós.
No dia da festa, após uma alvorada
de foguetes e a audição do hino, através do serviço de alto-falante da
Prelazia, A voz da LEC, começaram os desfiles encabeçados pelo Ginásio
Pinheirense, com todos os alunos com farda de gala. À frente as bandeiras do
Brasil e do Maranhão (o pavilhão de Pinheiro só seria criado dez anos depois),
conduzidas por uma comissão formada pelas alunas com estatura mais elevada:
Honorina, Raimunda de Jesus Beckman e Isis Franco de Sá. Seguiam-se os colégios
da rede pública, Odorico Mendes e Elisabeto Carvalho, Escola Paroquial, Escola General
Dutra e até os alunos do Curso de Alfabetização, mantido pela Maçonaria. No
palanque de honra, além do Prefeito Municipal, anfitrião da festa, o Des.
Elisabeto, os deputados Costa Rodrigues e Orlando Leite, o juiz Dr. Guerreiro, o
Bispo Dom Afonso, o Pe. Tiddei respondendo pela Paróquia após o regresso do então vigário Pe. Fernando Meloselli, o Governador
em exercício Eurico Ribeiro e o mais importante, representando o Presidente da
República, o Sen. Assis Chateaubriand. Após a missa campal o povo se dirigiu
para o Obelisco inaugurado com um brilhante discurso do Dr. Guerreiro, ocasião
em que foram guardadas em seu interior exemplares da edição comemorativa do
evento, garrafas de cachaça, moeda em circulação, cartas, bilhetes, discursos
para chegarem às novas gerações, no sesquicentenário. No sobrado d sr. Coló
fora montada uma exposição de pinturas com obras do pintor Newton Pavão e de
outros artistas plásticos maranhenses, com entrada franca. À tarde no Estádio
Costa Rodrigues grande partida de futebol entre um time levado de São Luis e a
turma de casa, com grande participação popular.
À noite, após um lauto banquete na
residência do Sr. Américo de Souza Gonçalves para os convidados de honra,
começou o Baile de Gala na sede do Cassino Pinheirense, animada pela Orquestra
Jazz Ribamar.
No dia seguinte as comemorações
prosseguiram à tarde no Fomento Agrícola, coordenadas pelo Sr. diretor Henrique
Schalcher com exposição dos nossos produtos agrícolas e de espécimes
selecionadas de eqüinos, bovinos, asininos e suínos de nossa pecuária. Nessa
oportunidade o Sen. Chateaubriand exibiu-se cavalgando um touro. Essa matéria
ilustrada por fotos do controvertido senador e proprietário dos Diários
Associados e da Revista O Cruzeiro, foi publicada em edição especial.
Coroando os festejos, após a
representação de comédia por ginasianas (inclusive eu), do coro falado exaltando
as belezas e riquezas do município, houve um grande show com artistas
conhecidos, trazidos do Rio pelo senador: Gilberto Alves, Zezé Gonzaga, dentre
outros. Não tivemos oportunidade de cantar Peixe Vivo, para o Presidente
Juscelino e que ensaiamos com as Irmãs, quase todas mineiras.
O ano chegou ao fim e em dezembro
houve a colação de grau da Primeira Turma de Ginasianos. Até então as únicas
festas de conclusão de cursos que participamos foram as entregas dos
certificados para os alunos Quarta série do Primário e do diploma da Quinta série
das Escolas Públicas. A solenidade era realizada na sede da Prefeitura, com os
trabalhos dirigidos pelo prefeito, com a presença do juiz, promotor, delegado e
da diretora do Colégio. As concludentes usavam vestidos em cores diferentes,
geralmente azul claro e rosa. Após os discursos de praxe era servido um pequeno
coquetel constando de guaraná, Cola Jesus, fatias de bolo de trigo e pastéis.
Também ao término dos cursos
profissionalizantes de Datilografia dado por d. Elza Leite e os de Corte e
Costura e Culinária, por d. Amélia Campos, havia uma solenidade para entrega
dos certificados, e os esperados discursos, realizada no salão de festa do
Cassino Pinheirense; a turma de Culinária servia um ligeiro jantar, constando do
cardápio alguns pratos aprendidos nas aulas.
A festa de conclusão das ginasianas
em 1956 só não foi melhor por causa da triste lembrança da turma de rapazes que
foi impedida de concluir o curso. A solenidade revestida de pompa foi realizada
no Cine-Teatro Pinheiro, local escolhido pelo grande número de convidados, pois
além dos pais e demais familiares, foram os amigos e colegas de outras séries.
A mesa armada no palco contou com a presença de Dom Afonso, da Madre Dolores,
do Prefeito Dico Araujo, do Dr. Elisabeto Carvalho, do Dr. Guerreiro e outras
autoridades que compuseram a mesa dos trabalhos, inclusive do diretor do jornal
“Cidade de Pinheiro”, Sr. Francisco Castro Gomes. Após a abertura com entoação
do Hino Nacional cantado pelos presentes, começou a chamada das concludentes
que subiam ao palco para receberem seu certificado assinado pela Madre
Diretora, tendo no verso o histórico escolar com as respectivas notas.
Ouviram-se os discursos por parte do Sr. Bispo, do Paraninfo e da oradora. Ao
final da solenidade o Hino do Centenário. Também foi servido um coquetel,
realizando-se o baile de formatura no dia seguinte.
O ano de 1957, após a ressaca da
festa de Reveillon no Cassino Pinheirense, iniciou com as novidades trazidas
pelos conterrâneos que estudavam em São Luís.
Começaram a aparecer no jornal
“Cidade de Pinheiro“ os poemas do poeta Abílio Loureiro que fez escola entre
nós, ensinando-nos lirismo e despertando nossas emoções, extravasadas através
de sonetos, acrósticos e outros gêneros poéticos. Aymoré, José Anastácio Soares,
Abraão Cardoso, eu e outros moços e moças. Também de Francisco Castro, Jurady e
Erasmo Leite.
Outros poetas e cronistas saíram da
concha do anonimato, venceram a timidez e começaram a publicar seus trabalhos:
prof. Maria Quitéria, Carolina Moraes, Leomar Veloso, Antônio Carlos Lobato e a
prof. Marita Lobato Gonçalves e Graça Moreira estas na prosa.
Aymoré nas férias trouxe na bagagem
alguns long-plays de boleros (Boleros em surdina, Love, etc), outros de mambo,
rumba, samba-canção até um de Nat King Cole que não sei como não furou, pois
era o mais tocado. Aproveitávamos para improvisar uns saraus dançantes lá e
casa, até às 22:00h quando mamãe começava a fechar a casa. Faziam parte desse
grupo: os irmãos Leitinho, Jurandy (acadêmico de Direito), os irmãos Durans,
Danilo, Darly e Niedja,os irmãos Santos José Maria, Maria Alice e Delfina,
Maria Helena e Socorro, Cindoquinha e Sofiinha, Edméa e Cristina, Flory, Maria
Francisca (Cocota de ZéPedro), Eldonor, Lauro, Ernaldo, Ary, Capitão e claro,
Aymoré e eu.
Em outras noites sentávamos no
batente do portão da Casa de Paulo de Tarso, com um poste de ferro bem em
frente e matávamos o tempo com adivinhações, charadas, anedotas e o jogo de Impugna;
este com o auxílio de um dicionário ilustrado de Português, da Lello, deixado
por papai.
Também fazíamos passeios na Faveira,
no sítio do Sr. Zé Santos, no Fomento em casa do Sr. Edgar Cordeiro, pai de
Anaclan, no sítio do seu Campos, de Rosa Gaia, na Ilha de Ventura, atrás de
frutas. Também, apostávamos corridas de bicicleta, bater papo no canto do Sr.
Antônio Gonçalves esquina com a Praça Gal. Dutra, onde houvera uma frondosa
figueira. Apesar da aparente monotonia da cidade, a nossa vida era bem agitada.
Gracinha Moreira, Lucilene Abreu,
Maria Lúcia Cerveira, Darly Durans, Rosário Martins, Nair Amate e o nosso
grupo, improvisávamos umas partidas de vôlei, geralmente nos campos da Faveira.
No dia 20 de janeiro a festa de São
Sebastião, antecedida por novenas era a apoteose das férias para quem, como eu,
não curtia festas pré-carnavalescas. Havia a Missa Solene cantada, procissão e
a animação do Largo. O organizador da festa, era sempre o Sr. Sebastião Reis,
mais conhecido por Baião, cunhado do nosso tio Paulo Castro que lhe dava uma
ajuda.
No carnaval, além dos bailes no
Cassino, as moças organizavam blocos com fantasias de havaianas, outras de
colombina, pierrô ou mesmo de cara limpa. Na rua a movimentação ficava por
conta dos assaltos nas casas de amigos, todos de fofão e máscara. General Leite
e João Santeiro organizavam os bailes de segunda.
Com o término das férias voltamos à
nossa vida rotineira, quebrada no mês de Maio, com as noitadas na Praça da
Matriz. No Ginásio, as Irmãs pregavam um pôster com a imagem de N. Sra. e
incentivavam a disputa entre as alunas para ver quem fazia mais “florzinhas”e
tinha seu nome colocado nos pés da santa. Havia, outrossim, a maratona de
jaculatórias, mas não tínhamos cacife para ganhar de Inácia, que rezava
centenas por dia.
Nesse período perdemos Tio Zé Reis,
solteiro, por “delirius tremens”, para tristeza da família Castro.
Também nesse ano tivemos a primeira
loura da cidade: Maria Delfina cujos cabelos foram descoloridos com água
oxigenada e limão, por Benedita Enfermeira. Foi um furor: todos os rapazes
queriam namorá-la, como o mano Aymoré, Leitinho, Danilo, Eldonor, Ernaldo. Não
havia concorrência; foi nessa época que tivemos noção do fascínio exercido nos homens
pelas louras, pelo inusitado, pelo diferente.
A Gripe Asiática continuava a tirar
o sono dos nossos familiares, pois continuava ativa, ceifando vidas. Aymoré a
contraiu em São Luís, indo convalescer em casa, recuperando-se completamente
para alívio de toda a nossa família. Aproveitou a doença e não quis mais voltar
para o Seminário e nas férias era um dos mais animados.
Em julho com os amigos que estudavam
em São Luís, de volta a Pinheiro para seus trinta dias de férias, a animação
tomou conta da cidade. Piqueniques, passeios, partidas de vôlei, papos, corridas de bicicleta, culminando com os festejos de Santo Inácio,
entre os dias 23 e 30 de julho, quando era realizada a procissão e o esperado
Largo. Nesse ano, para o baile do Cassino, o presidente Nezinho Soares trouxera
a cantora Orlandira Matos que fora nossa hóspede. Aproveitando as férias, d.
Dóris, mãe de Edméa e nossas vizinhas, pediu para mamãe para eu acompanhá-la
numa viagem em visita a seus amigos e parentes. De São Luís a Teresina fomos de
trem, passando alguns dias em Rosário, residência anterior da família do Sr.
Edésio Castro, ficando hospedadas em casa de Marly e Fernando, seus sobrinhos e
amigos; de lá, fomos a Caxias visitar o Sr. Djalma, irmão de d. Dóris e
finalmente em Teresina, hospedadas em casa de d. Joaninha, sua irmã. Passamos
uns quinze dias viajando e na volta soubemos do namoro de Aymoré e Edméa. Mamãe
ficou chateada, pois ainda nutria a esperança do filho voltar ao Seminário.
Em agosto com a volta dos amigos
para São Luís, as aulas recomeçaram, mas o mês ainda não tinha acabado quando
fomos surpreendidos com a morte de Elcimar Cordeiro, por eclampsia pós-parto.
Ela havia deixado o Ginásio para casar-se com Wilson, mais conhecido por
Carimbo. Apesar de quase todas já terem perdido alguns entes queridos, essa
morte de uma colega tão jovem abalou a nossa estrutura emocional.
Nesse mês, no dia 22 completei 15 anos, ganhando uma festinha com bolo confeitado por d. Amélia Durans, mãe de Niedja e também um acordeón, cujas aulas eram dadas pelo Pe. Tiddei. Só queria tocar de ouvido, o que não agradou o padre que deu as aulas por encerradas. Tocava Parabéns a você, Peneirando e outros baiões.
Dezembro chegou rapidamente e houve
a segunda colação de grau do Ginásio
Pinheirense. A turma era pequena, menos de 20 alunos, entre moças e rapazes.
Para mim, 1957 marcou o despertar do
amor na pessoa de Carlos Antônio Corrêa, o Carrinho, que viajaria no fim do ano
para concluir seus estudos no Rio. Todos os seus amigos ficaram preocupados com
a sua saúde, pois nos jogos de Sete de Setembro, no pátio interno do Colégio,
ele exímio saltador de obstáculos com vara, caiu de cabeça, ficando
desacordado, após a quebra do equipamento.
O ano de 1958 irrompeu, apesar das
saudades do namorado, encontrando-nos empolgadas e muito animadas. Durante as férias,
acampou nas imediações do Campinho um grupo de ciganos e, levados pela
curiosidade, fomos visitá-los. Encontramos logo a barraca da cigana que fazia previsão do futuro, com um baralho velho que partíamos em
sua frente e também pela leitura das linhas das mãos: os vaticínios foram excelentes
– encontro do amor, reencontro de amores passados, alguém próximo a nós, com
inveja da nossa boa sorte, encontro com um homem mais velho e grande fortuna
para todas nós e a realização de uma grande viagem. Claro que ninguém
acreditou, levando tudo na farra.
Quando as aulas recomeçaram tudo o
que realizávamos era permeado por um clima de despedida, daí capricharmos,
sequer reclamando das aulas, dos professores, das disciplinas, nem quando fomos
suspensas de três aulas de Educação Física, por termos ido, depois de uma aula,
de uniforme, apanhar tamarindos na casa do Sr. Carrinho Pimenta. Irmã Ruth
deu-nos aquele sermão. Logo no início de março fomos com Pe. Sandro (ele de
lambreta, algumas de nós de bicicleta e as demais a pé) em Ponta de Santana, na
casa de d. Mundiquinha Durans, mãe de Marlinda, nossa colega. Levamos o nosso
farnel e passamos um dia agradabilíssimo. À tarde fomos visitar Maria da Graça
(Da Graça), minha prima, recém-casada com Zé Verdura. Claro que havia uma
intenção por trás dessa inocente visita: estávamos curiosas para saber detalhes
da lua-de-mel. Com 15 anos, nada sabíamos sobre o assunto, apenas imaginávamos.
Irmã Ruth soube e foi mais um
sermão, mas aprendemos mais coisas do que nas leituras dos poucos livros sobre
o assunto que nos caiam às mãos.
Recebemos, por pouco tempo uma nova
colega, Marilene Duailibe, de Santa Helena que não chegou ao término do ano.
Também nesse ano a Companhia de
Aviação Real inaugurou uma linha São Luís-Pinheiro-Belém. Era o progresso
chegando. A pista do aeroporto foi aumentada, melhorada, a estação de
passageiro com bancos, cadeiras, banheiros. Os aviões com dois motores à
hélice, DC-3, com capacidade para 20 passageiros, eram seguros e confortáveis.
Até então só utilizávamos aviões pequenos, monomotores,
chamados teco-teco, comandados pelos pilotos João Jose, Gaudêncio, Gualhardo,
Maranhão. Sua agente em Pinheiro era d. Amélia Campos, misto de professora de
costura e outras prendas, comerciante e política, presidente do diretório do
PSP. Quando a Real cancelou os vôos, de 1960, o comandante Olivar Weba montou
um pequeno empreendimento, adquirindo aviões monomotores mais modernos e monopolizando
esse segmento. Todas as aeronaves tinham um nome: Cobra 1, 2, 3, 4, até
tornar-se uma média empresa com vários aparelhos e pilotos. (Hildebrando,
Jurandir Juarez, Barros). Por essa época houve um terrível acidente na pista do
aeroporto do Tirirical com um desses monomotores pilotado pelo comandante Pedro
Santos e assistido por toda a família que o estava esperando. Ficamos
apavorados, com medo das viagens aéreas, rápidas, porém perigosas, ao invés dos
barcos à vela que demoravam dias para chegar a São Luís, substituídos por
barcos mais rápidos e seguros, movidos a motor. Franco Castro, Juquinha eram os
proprietários das embarcações mais requisitadas.
Edgar Cordeiro, pecuarista, comerciante,
exportador de babaçu e outros produtos, tornara-se milionário. Para conforto
próprio e de sua família adquirira um pequeno avião. Era um luxo!
Na época da Real, o funcionário dos
Gonçalves, seus agentes, encarregado da venda de passagens, acertos com
passageiros e pilotos chamava-se Antônio José Guterres. De bicicleta com uma
pasta contendo a relação de passageiros,debaixo do braço, ia para o
aeroporto, acompanhar o desembarque e embarque dos passageiros. Por onde
passava os interessados em viajar e confirmar o horário dos vôos gritavam: Ei,
Real, Real e Real é o nome pelo qual é conhecido até hoje. Grande empresário,
casado com a prof. Maria de Jesus Beckman, da primeira turma do Ginásio, mantém a sua simplicidade e afabilidade que
sempre o caracterizaram.
A festa de Santo Inácio, foi tão
marcante para todas nós que mereceu uma crônica de oito páginas, já publicadas
no meu blog.
Ainda no mês de julho assistimos ao
primeiro julgamento: era de um assassino e o nosso amigo Jurandy fora o
advogado de acusação, no prédio da Prefeitura. A acusação fora entregue para
seu pai Chico Leite, advogado provisionado que não perdia uma causa. Em
deferência ao seu filho acadêmico de Direito, Jurandy fez a sua estréia nas
lides jurídicas. Não lembro o desfecho do caso.
No dia 11 de agosto, Dia do
Estudante, o piquenique foi no Sítio Boa Vista do Sr. José Santos. Memorável.
As moças com Irmã Suzana e Irmã Geralda nas imediações da casa e os rapazes
mais distantes, com Padre Sandro. Fomos de caminhão, em duas viagens
diferentes.
Na Parada de Sete de Setembro
marchamos à frente das demais turmas, pois nesse ano, éramos concludentes. A Guarda da Bandeira foi formada
por Niedja, Flory e Maria Alice. À tarde as tradicionais partidas de vôlei com
as moças e de basquete com os rapazes.
Após o Dia da Independência, a nossa
turma com apenas 21 alunos, sendo dez moças e onze rapazes, começou a fazer planos
para a “formatura”. Para tal precisaríamos de dinheiro para os imprescindíveis
convites a serem confeccionados na capital; orquestra para o baile, assim como
a limpeza do clube; flores e velas para a decoração da Matriz. Como arranjá-lo
sem onerar mais as nossas famílias? Para resolver tantos problemas dividimo-nos
em grupos. Alguém deu a idéia de fazermos guloseimas para vender na hora do
recreio para as colegas de outras séries: faríamos filhoses, bolinhos de
tapioca, bolos vendidos em fatias, mingau de milho, arroz doce, e a receita
seria guardada para as despesas.
Fiquei na equipe dos convites. Como
gostava muito de Latim, escolhi uma citação para nosso lema: “In omnibus
respice finem”, com exatas vinte e uma letras, sendo que cada uma constava do nome
de um aluno. O paraninfo escolhido, por unanimidade foi o Pe. Sandro. A
programação não foi diferente das turmas concludentes dos anos anteriores:
Missa celebrada por Dom Afonso no dia de Nossa Senhora da Conceição, 8 de
dezembro, às 18:30h, às 20:00h a esperada Sessão Solene para entrega dos
certificados e o coquetel que seria servido no Patronato São Tarcísio.
Quanto ao baile a data ficou a cargo
de Maria Alice e Niedja. Combinamos que os vestidos seriam brancos. O de
Almerinda e o meu foram confeccionados em São Luís, pela modista Laice
Guimarães Cunha, irmã de Almerinda. As amostras dos tecidos, assim como os modelos
vieram com muita antecedência para escolhermos.
Falei com as colegas que o baile não
poderia ser no dia 9 de dezembro, aniversário de morte do meu pai. Qual não foi
a minha decepção quando soube que o baile teria que ser nesse dia, por
causa de compromissos já assumidos pela orquestra. Claro que eu não fui. Em
solidariedade, Almerinda também não participou e levou-me para dormir em sua
casa, para no dia seguinte viajarmos de carro de boi com seu irmão, Dr. José
Guimarães, Promotor de São Vicente Férrer e toda a família, para a fazenda do
seu tio e meu padrinho Alexandre Guimarães, onde seria realizado o batizado de
sua filha caçula Celina.
O jornal “Cidade de
Pinheiro”publicou uma minuciosa matéria sobre a Colação e foi fielmente transcrita
aqui, no início deste texto. Antes, porém, quero falar sobre um assunto
interessante. Soubemos logo cedo que dois deputados estavam em Pinheiro
hospedados com Diana Leite e que os mesmos participariam da Sessão Solene - eram
os irmãos Sarney: José, Deputado Federal e Evandro, Deputado Estadual. À tarde
quando nos deslocávamos para ornamentar a Matriz, com braçadas de flores e pacotes
de velas, ao passar pela casa de Diana, demos uma olhadinha pela frincha das
janelas. Os dois deitados cada um em uma rede num cômodo da frente, escreviam,
liam e decoravam os improvisos. Evandro lia e José repetia.
Após as festas natalinas cuidamos em
conseguir vagas nas escolas de São Luís, para continuarmos os estudos: eu iria
para o Colégio Santa Teresa, como interna, fazer o Científico. O meu enxoval,
seguindo orientação de Leyr Amorim e Nair Amate, também internas, já havia sido
encomendado: saias, blusas, combinações, camisolas, calcinhas, lenços, lençóis, fronhas, colchas, toalhas, tudo com
o número 49.
Maria Alice também iria para o Santa
Teresa fazer o Normal, como externa. Niedja, Terezinha, Flory, Maria Luisa,
Marlinda, Isabel disputaram vagas na Escola Normal e as conseguiram. Inácia foi
para Belém, estudar, hospedando-se com parentes de seus pais e Bibi iria de
mudança com seus pais para Juiz de Fora.
Graduei-me em Farmácia, Flory e
Niedja e Marlinda em Pedagogia, Inácia em Enfermagem. Maria Alice, Maria Luisa
e Isabel ficaram só com o Curso Normal; Terezinha foi trabalhar no Banco da
Amazônia, em Belém.
Quanto aos rapazes, alguns foram
estudar nos Maristas, como Adão, Eliézer, José Maria e José Reinaldo; outros no
Liceu e no Colégio São Luis, como Lauro, Ernaldo, José Isaias, Reginaldo,
Gladston e Leudimar. Não lembro o caminho tomado por João Quadros, natural de
Carutapera. José Reinaldo fez Odontologia, Adão e Lauro seguiram a carreira
militar, indo para Brasília e Três Corações, respectivamente; José Maria foi
para Volta Redonda fazer Engenharia; os demais fizeram concursos para o Banco
do Brasil.
Neste início de 2013, já perdemos os
colegas: Lauro, solteiro, morreu por doença auto-imune em São Luís; Adão –
diabetes em Brasília, casado, com filhos; José Maria morreu dormindo, provavelmente
de infarto agudo do miocárdio, em São Paulo, casado, com filhos; Reginaldo –
assassinado, por assaltantes em uma agência de viagens que abriu após a
aposentadoria em Macapá. Casado, com filhos; Bibí, de lúpus, no Rio Grande do
Sul onde morava após o casamento.
Os sobreviventes são: Ernaldo que se
mudou para o Rio desde a década de 1960; Eliézer, professor do Curso de
Farmácia e Bioquímico do Hospital Presidente Dutra, já aposentado, casado, com
filhos; de Gladston Leudimar e João Quadros não tive mais notícias; José Isaias
bancário aposentado em Coroatá, casado, com filhos; José Reinaldo quando em
atividade trabalhou na Secretaria Estadual de Saúde, no setor de Vigilância
Sanitária, casado com filhos.
Das moças, Almerinda perdeu há três
anos dois filhos – viúva; Flory, também viúva, professora aposentada e técnica
em Educação na Secretaria Municipal de Educação; membro-fundador da Academia
Pinheirense de Letras, Artes e Ciências (APLAC), com filhos; Maria Alice
enviuvou e mora em São Luis, com filhos; Terezinha e Inácia, ambas viúvas moram
em Belém, a primeira, bancária aposentada, com filhos, a segunda professora
aposentada da Universidade Federal do Pará, com filhos; Maria Isabel,
professora aposentada, mora em Pinheiro onde abriu uma academia de ginástica,
trabalha como voluntária na Fazenda do Amor Misericordioso, casada, com filhos:
Niedja, pedagoga, especializou-se em São Paulo onde se casou, trabalhou até
aposentar-se na Volkswagen, casada, com filhos; Maria Luisa, funcionária
aposentada do INSS, viúva, com filhos; Marlinda, professora aposentada, mora no
Rio, casada, com filhos; e eu, Moema, professora e pesquisadora aposentada da
Universidade Federal do Maranhão, membro-fundador da APLAC, proprietária de um
sebo em São Luís, casada, com filho.