Na minha infância passada totalmente em Pinheiro, não tínhamos muitas diversões, além da Missa das Crianças, às 8:00h aos domingos, seguida pelas aulas de catecismo. No período letivo as aulas ocupavam o nosso tempo, inclusive as imprescindíveis aulas particulares.
Nas férias, papai arranjava alguma atividade para preencher nosso tempo. Aymoré passou por oficinas de barbeiro, ferreiro e sapateiro, enquanto eu fui destinada às prendas domésticas. Aprendí e cheguei a fazer metros de renda de almofada, assim como pontos de cruz, paris e outros.
Raramente tínhamos permissão para ir ao cinema, único na cidade – Cine Glória – dos Paiva. Assistíamos somente às fitas sobre a Paixão de Cristo e filmes de capa e espada, devidamente acompanhados por Maria Lobato em quem meu pai depositava toda a confiança.
Preenchíamos o tempo disponível com as atividades próprias de crianças do interior: os garotos armavam arapucas pra apanhar caboclinhos ou usavam baladeiras para abater rolinhas. Nos dias de sol quente e bons ventos empinavam papagaios feitos em casa mesmo. As meninas brincavam com bonecas. Eu era um pouco solitária, pois papai só permitia que eu brincasse com filhas dos seus amigos e em nossa casa, daí iniciar-me na leitura, desde cedo.
O quintal era reduto comum, meu e de Aymoré; enquanto ele usava uma lente de papai para tentar concentrar os raios solares e queimar algodão e papel ou então um espelho para refletir a luz do sol no rosto dos transeuntes, eu acompanhava a azáfama das formigas, sempre atarefadas, carregando folhas para a sua rainha. Gostava, também de coletar libélulas, chamadas por nós de macaquinhos. Curtia abrir suas asas para ver as nervuras, observar os movimentos da cabeça, ver seus olhos revirarem e o mexer de suas antenas. Daí, talvez tenha nascido o meu interesse por animais vivos, principalmente insetos.
O quintal da nossa casa era dividido em três setores: o primeiro era o jardim onde um jardineiro fora contratado exclusivamente para cuidar das rosas e dálias do meu pai. O terreno cimentado era recortado por canteiros do feitio de estrelas, meias-luas, círculos, retângulos. Logo na frente havia um pequeno tanque onde mamãe criava umas marrequinhas, tendo no meio um pedestal com uma palmeira, parecida com a palmeira-sagu. O segundo, separado do jardim por duas tamareiras que nunca frutificaram era também cimentado, onde ficava o poço e a lavanderia, comunicando-se com a casa através da cozinha. Também quatro coqueiros cujos frutos secos caiam com frequência. Éramos proibidos de brincar nessa área. O terceiro tinha apenas uma passarela de cimento e ia até quase o fundo do quintal, onde havia dois pés de jucá, uma caramboleira, uma cajazeira e uma mangueira com frutos especiais (manga paris) e um coqueiro que foi plantado no dia em que Aymoré nasceu. Esse terreno era meio úmido e sombreado por causa das copas das fruteiras e possibilitava o crescimento, rente ao muro, de pés de urtiga e de camapu. Morria de medo de ser atingida pelas folhas de urtiga e meu pai sempre mandava cortá-las, pois os pelos urticantes que recobrem suas folhas e caule agem como uma injeção de histamina, produzindo uma sensação de queimadura e deixando empolado o local atingido. Já os pés de camapu eram mantidos, pois seu pequeno fruto, arredondado e amarelinho quando maduro, fazia a festa da gurizada. Eu, no entanto devo ter experimentado sem gostar, pois apanhava-os ainda verdes para brincar, atirando nos colegas, simulando uma guerra; também, em patos, galinhas criadas em galinheiro mas soltas na hora da ração de milho.
Em quase todos os quintais pinheirenses, sítios, beiras de estrada, o camapu era presença constante.
O tempo passou, entrei na adolescência e os interesses mudaram, principalmente quando comecei a fazer o ginásio.
Há uns 15 anos meu filho foi para Londres fazer um curso de Inglês na Universidade de Wimbledon. Meu marido aproveitou a chance para conhecer as obras dos grandes mestres da Pintura, visitando museus, galerias de arte, palácios, fortalezas, catedrais. Foi também à Escócia e à Áustria. Em Londres, curioso com os costumes e culinária foi a um hipermercado da Harrods, conhecer as frutas, verduras e legumes usados pela cozinha dos ingleses e ficou admirado de encontrar camapu brasileiro, à venda e por um preço relativamente alto.
Esquecida do camapu, voltei a lembrar-me há alguns meses quando publiquei no blog Pinheiroempauta um texto sobre as frutas silvestres, nativas em Pinheiro. Além do camapu, citei maria-pretinha, murici, ingá, araticum, anajá, tucum, macaúba, cauaçu, bacurizinho e outras mais. O conterrâneo e confrade dr. José Jorge Leite Soares, cônsul honorário da França, no Maranhão fez uma colocação interessante: o camapu é iguaria fina encontrada em restaurantes elegantes da França, geralmente em saladas de verduras e legumes, recobertas de chocolate e muito apreciado pelos franceses e ingleses. Pronto, meus sentidos ficaram em alerta e despertou-me a curiosidade de pesquisar a origem, distribuição geográfica, espécies cultivadas, valor alimentício, uso em medicina popular.
Eis o que encontrei sobre o nosso camapu das nossas batalhas na infância:
Raramente tínhamos permissão para ir ao cinema, único na cidade – Cine Glória – dos Paiva. Assistíamos somente às fitas sobre a Paixão de Cristo e filmes de capa e espada, devidamente acompanhados por Maria Lobato em quem meu pai depositava toda a confiança.
Preenchíamos o tempo disponível com as atividades próprias de crianças do interior: os garotos armavam arapucas pra apanhar caboclinhos ou usavam baladeiras para abater rolinhas. Nos dias de sol quente e bons ventos empinavam papagaios feitos em casa mesmo. As meninas brincavam com bonecas. Eu era um pouco solitária, pois papai só permitia que eu brincasse com filhas dos seus amigos e em nossa casa, daí iniciar-me na leitura, desde cedo.
O quintal era reduto comum, meu e de Aymoré; enquanto ele usava uma lente de papai para tentar concentrar os raios solares e queimar algodão e papel ou então um espelho para refletir a luz do sol no rosto dos transeuntes, eu acompanhava a azáfama das formigas, sempre atarefadas, carregando folhas para a sua rainha. Gostava, também de coletar libélulas, chamadas por nós de macaquinhos. Curtia abrir suas asas para ver as nervuras, observar os movimentos da cabeça, ver seus olhos revirarem e o mexer de suas antenas. Daí, talvez tenha nascido o meu interesse por animais vivos, principalmente insetos.
O quintal da nossa casa era dividido em três setores: o primeiro era o jardim onde um jardineiro fora contratado exclusivamente para cuidar das rosas e dálias do meu pai. O terreno cimentado era recortado por canteiros do feitio de estrelas, meias-luas, círculos, retângulos. Logo na frente havia um pequeno tanque onde mamãe criava umas marrequinhas, tendo no meio um pedestal com uma palmeira, parecida com a palmeira-sagu. O segundo, separado do jardim por duas tamareiras que nunca frutificaram era também cimentado, onde ficava o poço e a lavanderia, comunicando-se com a casa através da cozinha. Também quatro coqueiros cujos frutos secos caiam com frequência. Éramos proibidos de brincar nessa área. O terceiro tinha apenas uma passarela de cimento e ia até quase o fundo do quintal, onde havia dois pés de jucá, uma caramboleira, uma cajazeira e uma mangueira com frutos especiais (manga paris) e um coqueiro que foi plantado no dia em que Aymoré nasceu. Esse terreno era meio úmido e sombreado por causa das copas das fruteiras e possibilitava o crescimento, rente ao muro, de pés de urtiga e de camapu. Morria de medo de ser atingida pelas folhas de urtiga e meu pai sempre mandava cortá-las, pois os pelos urticantes que recobrem suas folhas e caule agem como uma injeção de histamina, produzindo uma sensação de queimadura e deixando empolado o local atingido. Já os pés de camapu eram mantidos, pois seu pequeno fruto, arredondado e amarelinho quando maduro, fazia a festa da gurizada. Eu, no entanto devo ter experimentado sem gostar, pois apanhava-os ainda verdes para brincar, atirando nos colegas, simulando uma guerra; também, em patos, galinhas criadas em galinheiro mas soltas na hora da ração de milho.
Em quase todos os quintais pinheirenses, sítios, beiras de estrada, o camapu era presença constante.
O tempo passou, entrei na adolescência e os interesses mudaram, principalmente quando comecei a fazer o ginásio.
Há uns 15 anos meu filho foi para Londres fazer um curso de Inglês na Universidade de Wimbledon. Meu marido aproveitou a chance para conhecer as obras dos grandes mestres da Pintura, visitando museus, galerias de arte, palácios, fortalezas, catedrais. Foi também à Escócia e à Áustria. Em Londres, curioso com os costumes e culinária foi a um hipermercado da Harrods, conhecer as frutas, verduras e legumes usados pela cozinha dos ingleses e ficou admirado de encontrar camapu brasileiro, à venda e por um preço relativamente alto.
Esquecida do camapu, voltei a lembrar-me há alguns meses quando publiquei no blog Pinheiroempauta um texto sobre as frutas silvestres, nativas em Pinheiro. Além do camapu, citei maria-pretinha, murici, ingá, araticum, anajá, tucum, macaúba, cauaçu, bacurizinho e outras mais. O conterrâneo e confrade dr. José Jorge Leite Soares, cônsul honorário da França, no Maranhão fez uma colocação interessante: o camapu é iguaria fina encontrada em restaurantes elegantes da França, geralmente em saladas de verduras e legumes, recobertas de chocolate e muito apreciado pelos franceses e ingleses. Pronto, meus sentidos ficaram em alerta e despertou-me a curiosidade de pesquisar a origem, distribuição geográfica, espécies cultivadas, valor alimentício, uso em medicina popular.
Eis o que encontrei sobre o nosso camapu das nossas batalhas na infância:
CARACTERISTICAS BOTÂNICAS
Planta rústica, pertence à família das Solanáceas, a mesma do tomate, da batata inglesa, do fumo, da berinjela, da pimenta, do pimentão. É uma planta herbácea, de hábitos perenes que chega a atingir 2 m de altura. Reproduz-se por sementes. As raízes podem atingir entre 10 e 15 cm de profundidade e o sistema radial é aprofundado atingindo 50 a 80cm. Seu caule é carnoso, esverdeado, anguloso e muito ramificado. As folhas são ovado-oblongas, alternadas, pecioladas, glabras ou pubescentes, aveludadas com margens onduladas. As flores são amareladas, isoladas ou em cacho, hermafroditas, e duram só 3 dias, quando são polinizadas pelo vento ou por insetos. O cálice, formado por cinco sépalas, frutífero, vesiculoso, intumescido como um balão, envolve todo o fruto, durante o seu desenvolvimento; inicialmente verde vai gradativamente tomando uma cor dourada à medida em que o fruto amadurece; essas sépalas além da proteção são ricas em carboidratos durante os primeiros vinte dias de crescimento. Os frutos são bagas com 100 a 300 sementes que levam 60 a 80 dias para desenvolver. Delicados, pequenos e redondos com diâmetro entre 1,25cm e 2,50cm, pesando 4 a 10gr. Quando maduros apresentam uma cor amarelada ou alaranjada, sabor adocicado, levemente ácido. Por suas características e sabor agridoce é considerado um fruto exótico.
A principal espécie é a Physalis angulata, nativa na Região Amazônica, da Venezuela ao Chile ao longo de toda a Cordilheira dos Andes. A Colômbia, onde é conhecida como uchua é cultivada, sendo o maior produtor. São conhecidas mais de 15 espécies, nas regiões temperadas, quentes e sub-tropicais de todo o mundo, principalmente da América Latina, Europa, Ásia e África. As principais são: P. peruviana, P. capcifolia, P. esquinooli, P. laceifolia, P. linkiana e P.ramosíssima. Em Portugal é conhecida por alquequenge; nos Açores por capuchos; no Equador por uvilla e no Japão por hosuki. Aqui no Brasil é denominada bucho de rã, saco de bode, tomate cafundó, erva-noiva, juá da roça, juá de capote, bate-testa, mata-fome, camapum e outros.
O tomatillo, prato de destaque na culinária mexicana é na verdade uma fisalis consumida desde os tempos dos astecas e indispensável no preparo da salsa verde.
A principal espécie é a Physalis angulata, nativa na Região Amazônica, da Venezuela ao Chile ao longo de toda a Cordilheira dos Andes. A Colômbia, onde é conhecida como uchua é cultivada, sendo o maior produtor. São conhecidas mais de 15 espécies, nas regiões temperadas, quentes e sub-tropicais de todo o mundo, principalmente da América Latina, Europa, Ásia e África. As principais são: P. peruviana, P. capcifolia, P. esquinooli, P. laceifolia, P. linkiana e P.ramosíssima. Em Portugal é conhecida por alquequenge; nos Açores por capuchos; no Equador por uvilla e no Japão por hosuki. Aqui no Brasil é denominada bucho de rã, saco de bode, tomate cafundó, erva-noiva, juá da roça, juá de capote, bate-testa, mata-fome, camapum e outros.
O tomatillo, prato de destaque na culinária mexicana é na verdade uma fisalis consumida desde os tempos dos astecas e indispensável no preparo da salsa verde.
PODER NUTRITIVO
O camapu é rico em vitaminas A (carotenoides), C. e algumas do complexo B. Também, minerais como ferro, fósforo. Possui grande concentração de proteínas, a fitoesteroides, além de alcaloides e flavonoides que combatem os radicais livres, prevenindo o envelhecimento precoce.
Usado no preparo de doces, geleias, compotas, sorvetes, como recheio de bombons, em decoração de bolos, substituindo cerejas, em molhos e, saladas; ingerida com carnes e é excelente para degustar vinhos e acompanhar cervejas.
Usado no preparo de doces, geleias, compotas, sorvetes, como recheio de bombons, em decoração de bolos, substituindo cerejas, em molhos e, saladas; ingerida com carnes e é excelente para degustar vinhos e acompanhar cervejas.
PROPRIEDADES QUÍMICAS, MEDICINAIS E INDUSTRIAIS
Até 2007 era cultivado apenas para pesquisa. A partir do ano seguinte começou a ser cultivada para exportação, inclusive em Mato Grosso e Minas Gerais (Montes Claros). A Austrália, também cultiva para exportação. Liofilizado é vendido em cápsulas.
Foi isolada pelo IOC de Salvador uma enzina – a fisalina – usada como excelente anti-inflamatório. A Universidade de Ribeirão Preto está testando o extrato bruto para inibir a multiplicação do bacilo de Koch, agente etiológico da tuberculose.
Sob a forma de tônico, reconstrói o nervo óptico; o chá das folhas elimina albumina do sangue reduz o colesterol. Antiviral combate gripes e resfriados e herpes; a infusão das raízes é usada no tratamento da hepatite e da malária.
A seiva é calmante e depurativa; o fruto é comestível, rico em carotenoides e flavonoides e quando cozido (toda a planta) é usado como desobstruente e diurético. No fruto, também é encontrado acetilcolina usada para baixar a pressão. O extrato da raiz, caule e folhas, possui propriedades anti-microbianas, assim como imunodepressoras devida aos vitaesteróides, diminuindo a rejeição a transplantes e atacando várias alergias. Anti-tumoral é indicado no tratamento das hemorróidas, devido a fisalina. A ritalina é usada para eliminar pintas na testa.
Alivia dores de garganta, usada no tratamento da diabetes (frutos, folhas e raízes); reumatismos, doenças da pele, bexiga, rins e fígado.
Esse é o nosso rústico camapu, de origem obscura, denominado “bombom da roça,” hoje frequentando a mesa dos restaurantes mais requintados do Brasil e do exterior. Uma caixinha com 100g varia de R$ 5,00 a R$ 10,00 ou 3 a 5 euros.
Foi isolada pelo IOC de Salvador uma enzina – a fisalina – usada como excelente anti-inflamatório. A Universidade de Ribeirão Preto está testando o extrato bruto para inibir a multiplicação do bacilo de Koch, agente etiológico da tuberculose.
Sob a forma de tônico, reconstrói o nervo óptico; o chá das folhas elimina albumina do sangue reduz o colesterol. Antiviral combate gripes e resfriados e herpes; a infusão das raízes é usada no tratamento da hepatite e da malária.
A seiva é calmante e depurativa; o fruto é comestível, rico em carotenoides e flavonoides e quando cozido (toda a planta) é usado como desobstruente e diurético. No fruto, também é encontrado acetilcolina usada para baixar a pressão. O extrato da raiz, caule e folhas, possui propriedades anti-microbianas, assim como imunodepressoras devida aos vitaesteróides, diminuindo a rejeição a transplantes e atacando várias alergias. Anti-tumoral é indicado no tratamento das hemorróidas, devido a fisalina. A ritalina é usada para eliminar pintas na testa.
Alivia dores de garganta, usada no tratamento da diabetes (frutos, folhas e raízes); reumatismos, doenças da pele, bexiga, rins e fígado.
Esse é o nosso rústico camapu, de origem obscura, denominado “bombom da roça,” hoje frequentando a mesa dos restaurantes mais requintados do Brasil e do exterior. Uma caixinha com 100g varia de R$ 5,00 a R$ 10,00 ou 3 a 5 euros.
um pé de camapu surgiu no meu jardim, sem que ninguém o houvesse plantado... trouxe-me de volta recordações da infância, catando os frutos no Juruá, sítio de meu avô. Os frutos nasceram, amadureceram e trouxeram também, não só as lembranças, mas o sabor da infância
ResponderExcluirum pé de camapu surgiu no meu jardim, sem que ninguém o houvesse plantado... trouxe-me de volta recordações da infância, catando os frutos no Juruá, sítio de meu avô. Os frutos nasceram, amadureceram e trouxeram também, não só as lembranças, mas o sabor da infância
ResponderExcluirLi ainda hoje reportagem dando conta que o camapu se confirmou, em pesquisa da Universidade do Pará, como neurogênico - induz a formação de novos neurônios no hipocampo de ratos. Se for confirmado, poderá levar ao desenvolvimento de medicação para tratamento de Alzheimer e demais doenças relacionadas a memoria curta.
ResponderExcluir