MOEMA

MOEMA
PAPIRUS DO EGITO

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

DE MOEMA PARA ORZINETE


Amigos,
           Estamos aqui reunidos para festejar mais um ano de vida dessa pessoa especial e muito querida por todos nós – ORZINETE.
            Farmacêutica por profissão, vocacionada para o magistério, Orzinete foi ao longo de mais de vinte e cinco anos professora de Biologia, repassando para os seus alunos todo o conhecimento que adquiriu de seus mestres durante a sua vida acadêmica, enquanto aprendia com seus alunos tudo o que lhes ensinava.
             Inteligente, esforçada, determinada, sacrificou muitas noites na elaboração de roteiros, esquemas, planos de aula, material áudio-visual, mapas, gráficos, projetos, resumos de suas pesquisas para apresentá-los em congressos, adquirindo, dessa forma, um lastro de experiências que pavimentaram o caminho que ora percorre: a pesquisa aplicada à Saúde Pública.
             Durante quatro anos trabalhamos lado a lado no Laboratório de Entomologia do Departamento de Patologia da Universidade Federal do Maranhão, cumprindo compromisso assumido pela Secretaria Estadual de Saúde, arrolada como co-participante do Programa Interinstitucional de Pesquisa das Doenças Endêmicas do Maranhão. Também faziam parte a UFMA, através dos seus professores-pesquisadores, a então SUCAM que lhe dava o apoio logístico, o CNPq que concedia bolsas de Iniciação Científica que contemplava os acadêmicos engajados nos projetos e, finalmente a FINEP com o suporte financeiro, o que possibilitou a aquisição dos equipamentos essenciais e imprescindíveis para a realização das pesquisas. As doenças estudadas foram: Esquistossomose, Malária e as Leishmanioses.
                 Deixo aqui consignado que a participação de Orzinete foi fundamental para o êxito do nosso projeto Levantamento da fauna flebotomínica da Ilha de São Luis.
                  Outrossim, quero registrar que não foi fácil obtermos a sua liberação. A direção do Instituto Oswaldo Cruz (IOC) não queria prescindir dos seus serviços já tendo, inclusive um projeto para implantação de um laboratório de diagnóstico do vírus HIV, o qual seria dirigido por ela. Tive que apelar para instâncias superiores da UFMA para conseguir a sua valiosa colaboração. Corria o ano de 1986 e a competência de Orzinete já era reconhecida.
                   Hoje está mais do que patenteado que o IOC perdeu uma bioquímica, porém a Saúde Pública ganhou uma epidemiologista com sólido embasamento no ensino e na pesquisa.
                   A sua ida para a FUNASA propiciou-lhe a oportunidade de ir mais longe no plano das experiências vividas.
                    Dinâmica, inventiva, com compulsão em recriar velhas técnicas para obter resultados novos, a partir de métodos conhecidos e por ela exaustivamente testados e repetidos, Orzinete se superou, tornando-se polivalente tanto na Malacologia como na Entomologia.
                   A sua motivação básica está ligada à determinação de suplantar obstáculos, à sua intuição perspicaz, ao prazer de doar o seu tempo e os seus conhecimentos, generosamente, sem pensar em compensações pecuniárias ou em si mesma.
                    Íntegra, leal, confiável, responsável no cargo que ocupa, esforça-se com entusiasmo, num moto-contínuo, para justificar a confiança depositada pelos seus superiores. Orzinete não se contenta com as suas realizações, procurando estar sempre a par das inovações técnicas de diagnóstico no seu campo de atuação. Perfeccionista, faz cursos de especialização, atualização, aperfeiçoamento, participa de treinamentos, encontros, congressos, seminários, jornadas, dentro e fora do Estado, representando sempre com distinção a Instituição para qual presta serviços.
                      Orgulhosa do seu trabalho, porém modesta, discreta, solícita, amável com todos, Orzinete conquista amigos por onde passa: Colégio dos Irmãos Maristas, Liceu Maranhense, Instituto Oswaldo Cruz – Ma e agora na FUNASA.
                   Influenciada pelos eflúvios do sol, nasceu sob um dos signos mais fortes – LEÃO -, regido pelo astro-rei que leva os leoninos a brilhar em suas carreiras ou em quaisquer ramos de atividades a que se dedicam. Portanto, independente da vertente a que se destinou, Orzinete está fadada ao sucesso: filha exemplar, mãe extremosa de Gregório, profissional dedicada, não se permitindo um tempo só seu para o descanso e o lazer. Foi aluna disciplinada, interessada e, no começo de suas atividades como pesquisadora, não se deixou abater diante das vicissitudes da vida e dos percalços inerentes à condição humana.
                     Seus conflitos foram sempre ocultos sob uma aparência dinâmica e extremamente calma, nunca permitindo que atrapalhassem as suas atividades. Atrás dessa calma, no entanto, há uma mulher capaz de grandes lutas, uma batalhadora valorosa, uma desafiadora de obstáculos, pois esses pequenos entraves deram-lhe o impulso necessário para transformar os desafios em duelos. E ela foi à luta, conciliando o papel de mãe e de pesquisadora.
                     Orzinete é uma pessoa da qual nos orgulhamos de tê-la como amiga; é um privilégio fazer parte do seu círculo de amizade e ainda mais ser escolhida para madrinha do seu precioso Gregório.
                      A ligação das pedras preciosas com a personalidade dos indivíduos remonta a tempos imemoriais e é calculada pela data de nascimento e influência do Zodíaco. Cada signo recebe uma ou mais pedras preciosas como símbolo e ponto de referência.
                      O signo de LEÃO corresponde ao sol que por sua vez está associado ao rubi e ao topázio. O rubi simboliza a energia criadora do sol, ligada à distribuição da justiça, enquanto o dourado glorioso do topázio simboliza o sol, do qual Orzinete e todos os leoninos retiram a sua energia, realeza e liderança. É também a pedra que simboliza a FARMÁCIA, ao lado do cálice envolvido pela víbora, talvez porque o topázio é representativo da perfeição e do poder. Também caracteriza uma motivação investigadora que leva à busca do conhecimento e da sabedoria. Os antigos diziam que era o princípio que animava a vida. Os chineses achavam que representava a nobreza. A tradição cristã fez dele o símbolo da justiça, da temperança, da clemência, do amor divino, do amor verdadeiro, e da amizade.
                       Por seus atributos excepcionais, por sua trajetória de vida impoluta e por sua postura digna, correta, corajosa e generosa, passo às mão de Orzinete este talismã para protegê-la e mantê-la sempre íntegra e bem sucedida: é um topázio, símbolo de sua formação em Farmácia e do seu signo Leão, troféu a que faz jus pelos excelentes serviços prestados à Educação e à Saúde Pública do Maranhão.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

De Marita para Inez

Querida Inez.

Que pena a vida ter nos separado fisicamente. Eu perdí, asseguro-te. Sabes por que? Lembro-me com imensas saudades das nossas conversas de fins de tarde, em Pinheiro, sentadas à porta da Farmácia da Paz, onde, de minuto em minuto, levantavas para atender um cliente que chegava.
Contavas para mim histórias muito engraçadas que sabia pela tua amizade com a madrinha Carmen, minha mãe. Tomei conhecimento maior sobre a cidade de Pinheiro da primeira metade do século XX através das tuas narrativas, Inez. Tu me falavas das ruas e das casas, das famílias e das autoridades; das festas religiosas e dos cantos no coro da Matriz; dos bailes especiais e dos teatros; das moças bonitas e elegantes e daquelas que se vestiam de maneira destacada; dos amores e dos casamentos. Contavas como a população viajava para a capital a bordo das embarcações de belos nomes, cujos nomes me enlevavam como: Cisne Negro, Hércules e Dunquerque, que bonito! Também discorrias sobre as tragédias como a explosão da Usina Providência, quando perdeste o noivo, uma das vítimas do incêndio. Falaste-me do naufrágio do Hércules (e eu imaginava um barco gigantesco e forte) que soçobrou (parece-me) à noite por ter-se chocado com a temida pedra do Itacolomy, o terror dos barqueiros que navegavam na Baia de Cumã.
Se alguma coisa aqui está errada desculpa a minha memória que nada representa perto da tua. Esta é uma pequenina prova de todos estes fatos, relatados a mim, por ti, amiga, com uma grande riqueza de detalhes.
...E assim eu me deleitava diante do formidável Livro de Histórias Pinheirenses, que eu tinha ao meu dispor.
Inez,
Que dizer de ti, para ti?
Uma mulher bonita, filha, irmã, esposa, mãe e amiga excepcional! Uma mulher onde a vaidade ganha uma característica diferenciada, porque nunca está ausente. É necessário enumerarmos teus impecáveis vestidos de seda, de linho ou de outros tecidos especiais; a maioria das vezes estampados em cores vibrantes; de muito bom gosto; de modelos que refletiam os últimos ditames da moda; bem ajustados ao corpo, outra característica digna de destaque.
Inez, sempre tiveste um corpo que valorizava tudo o que usavas. Um corpo sem excessos, pelo contrário, um corpo adequado para a tua estatura: quadris coerentes com todas as medidas, pernas bonitinhas, busto normal e cintura bem marcada.
Os cabelos estavam constantemente cortados (presume-se) porque nunca os vimos compridos ou curtos demais, e emolduravam o rosto sempre na mesma medida. Nunca eu te vi se penteando diferente, especial. O jeito simples como te penteias está em perfeito acordo com a tua personalidade. Hoje, alguns anos depois desse nosso convívio mais próximo, acho que continuas a
mesma. Escolhes as roupa que queres vestir. As cores que te agradam. E tens a sagacidade de dizeres não a qualquer modelo de butique afamada, que compram pra ti, mas que na realidade não achas que está de acordo com a tua maneira de ser.
Relembrando mais uma vez os tempos de Pinheiro, bem cedo, ao acordares, ias comprar, ao teu gosto, o tipo que conhecemos e aprendemos a gostar: a Inez bem vestida,(cores alegres), bem calçada, sempre de sapatos de saltinhos fechados e discretos. Compondo esse perfil, mas se destacando de quase todas as senhoras da cidade, haviam os acessórios: colares, brincos, anéis e pulseiras. Mas não eram acessórios do século XXI – bijuterias –Eram jóias valiosas, lindas e ...barulhentas.
Sim, as belas e barulhentas pulseiras que deram a Inez um ar especial. Não pensem que digo como crítica. Falo como admiradora e adepta inconteste das pulseiras que brilham, que falam, que emitem sons, que fazem barulho.
Também gosto de usá-las. Será que aprendi contigo essa particularidade? Mas devo esclarecer uma coisa, minhas pulseiras são jóias do século XXI.
Enfim, querida amiga, o sorriso sempre a iluminar o teu rosto porque a alegria de viver sempre foi uma característica marcante em tua vida...
E esses teus olhos marotos e inquietos nos dão, constantemente, a certeza de que estamos diante de uma pessoa inteligente; que estamos diante de uma pessoa de memória mais prodigiosa que conheço; que estamos diante de um monumento de mulher – Inez de Castro.

terça-feira, 22 de janeiro de 2013


 INEZ CASTRO

O Centenário de Inez Castro, neste 21 de janeiro, é uma data na História de Pinheiro.
Durante os 200 anos de sua existência, como vila e Município, mais da metade foi vivido por Inez, que presenciou e vivenciou todas as vicissitudes da nossa cidade, sendo testemunha dos acontecimentos, das alegrias e tristezas que viveu o povo de nossa terra durante esse século.
Inez é uma figura marcante, um monumento da cidade, com suas lembranças, sua  história e seu trabalho, desde quando mocinha até os dias  atuais, comunicando a sua bondade, a sua inteligência e a beleza da família que construiu a Farmácia da Paz, com o legendário José Alvim, a mais antiga do Estado, que tem em Inez uma memória viva do que foi a saúde municipal ao longo de todos esses anos.
Portanto, a comemoração do Centenário de Inez não pertence à família Castro, mas a todos nós, pinheirenses, que temos em Inez um ícone representativo da mulher da Baixada e de suas virtudes.
Parabéns a  todos os filhos, netos, bisnetos, genros e noras pela data festiva!
                      Mil anos de vida e um século de abraços!
                                                                            José Sarney

 SOBRE AS MEMÓRIAS DE INEZ DE CASTRO
  Moema de Castro Alvim


Os registros biográficos despretensiosos de pessoas longevas, aparentemente comuns, costumam surpreender-nos pela riqueza e diversidade de informações que nos deixam entrever aspectos históricos e sócio-culturais e até mesmo econômicos de uma comunidade nos primórdios de sua formação, contribuindo para um melhor conhecimento e uma maior extensão a respeito da vida social dos primeiros moradores, revelando o que não poderia ser percebido através das fontes tradicionais da micro-história.
Construindo minuciosamente a biografia de Inez de Castro, utilizando um pequeno gravador, através do qual foram sendo registradas as reminiscências de nossa mãe, o mano José Paulo, traçando previamente um roteiro com muita dedicação e persistência, conseguiu recriar toda a  trajetória de sua vida, desde o seu nascimento, procedência dos seus pais, suas atividades ocupacionais e as dificuldades para criar com dignidade seus dez filhos; o bairro em que fora criada, próximo à Igreja Matriz e à Faveira, considerada um dos braços do Rio Pericumã, onde o primeiro núcleo urbano teria se estabelecido; também o aprendizado das primeiras letras, seus mestres, os métodos utilizados pelos professores leigos, até a instalação da primeira escola oficial.
Perlustrando a história de vida dessa mulher singular e extraordinária, tem-se a idéia da interação dos outros indivíduos do mesmo estrato sócio-econômico, em Pinheiro, cujos moradores estavam presenciando à transmutação de uma pequena povoação, outrora sesmaria de índios, em vila e depois em cidade que se tornaria, alguns anos depois, a mais importante da Região da Baixada.
Protagonista e testemunha, Inez participou de todo esse processo, ativamente, assistindo às grandes transformações que ocorreram na década de 1920, marco do desenvolvimento do pequeno burgo, pálido reflexo das mudanças que aconteciam no mundo, conseqüentes da Primeira Guerra Mundial. Surgido na Europa semi destruida, esse movimento revolucionário cultural fora criado por americanos expatriados, ricos, ociosos e sequiosos de usufruir o que o Velho Continente tinha ainda para oferecer e que, a partir dessa época, perdera a sua hegemonia econômica para os Estados Unidos, consolidada pela Grande Depressão de 1929.
As Artes como a Pintura, a Escultura, a Arquitetura e até a Música, a Poesia e a Literatura, literalmente foram recriadas por um grupo de intelectuais como Hemingway, James Joyce, Scott e Zelda Fitzgerald, Gertrude Stein, Picasso, Rodin, Braque, Rousseau, Apollinaire, Le Corbusier e muitos outros que influenciaram toda uma geração chamada, erroneamente de geração perdida. Essas idéias varreram todo o mundo, atingindo, também, o Brasil, culminando com a Semana de Arte Moderna, em 1922. Foi uma verdadeira revolução de valores, irradiando-se de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais para todas as regiões brasileiras, libertando-as dos cânones rígidos impostos pela antiga Metrópole, mesmo após cem anos de sua independência política.
Os arautos dessas boas novas foram discípulos do maranhense Graça Aranha, escritor, membro da Academia Brasileira de Letras e diplomata, radicado durante anos em Paris. Dentre os seus seguidores destacam-se Oswald de Andrade, Mário de Andrade, Tarsila do Amaral, Anita Malfati, Portinari, Manuel Bandeira, Menotti del Picchia, Di Cavalcante e muitos outros intelectuais que despertaram o gigante adormecido com as suas idéias arejadas e modernizadoras, seu modo de fazer literatura, poesia, escultura e pintura, dando ao Brasil uma outra feição, uma nova personalidade, oportunizando a criação da sua identidade cultural de autêntica brasilidade.
E os ecos dessas mudanças chegaram até Pinheiro, através de um jovem juiz, de origem piauiense, o Dr. Elisabeto Barbosa de Carvalho, sintonizado com essas transformações que se processavam em todo o Brasil. Com a colaboração de outros amigos, também sensíveis a essas mudanças, levaram à recém-criada cidade algumas dessas novidades; também para quebrar o clima de hostilidades, acirradas principalmente nos períodos eleitorais e que se refletiam no marasmo e atraso em que o pequeno burgo vivenciava.
Datam desse período a fundação do jornal “Cidade de Pinheiro”, ainda hoje em circulação, inauguração de clubes sociais e esportivos com a formação dos primeiros times de futebol, de teatros com encenação de peças e outras atividades culturais; maior incremento das festas religiosas e profanas, como o carnaval, as quadrilhas juninas; construção do Mercado Central, do Matadouro; reconstrução da Igreja Matriz, substituindo o antigo templo por um com duas torres; a transferência do cemitério do adro da Igreja dos Remédios (atual Praça de São Benedito)para um espaço mais amplo  com capacidade para um maior número de túmulos, com a construção de um cemitério com áreas delimitadas por calçadas de cimento, com capela,  frontal de alvenaria trabalhado e totalmente murado - o Cemitério Santo Inácio, ainda hoje em atividade. Também ocorreu a instalação do Instituto Pinheirense e da Escola Normal que infelizmente só funcionou um semestre e, em 1927, do Grupo Escolar “Odorico Mendes”, dirigido por professoras normalistas além da formação da Biblioteca Popular. Outras importantes aquisições da recém cidade foram: a Companhia Agrícola Industrial, o Campo de Sementes, o Centro Agrícola Santo Inácio de Pinheiro e uma pequena empresa de transporte terrestre com a chegada do primeiro caminhão. No campo social, deu-se a reativação da Sociedade Beneficente, a criação da Sociedade Mortuária e o Centro Artístico Operário e Eleitoral.
Inez presenciou tudo, participou de tudo, informando-se de tudo, inclusive quando o terror e a insegurança apossaram-se dos habitantes do município, por ocasião de uma bárbara chacina que maculou de sangue o solo pinheirense. O seu pai, Capitão Francisco Castro era o delegado na época e por essa fonte ela soube dos pormenores. Vivendo à frente do seu tempo, Inez, loquaz, desinibida, comunicativa, articulada, expressando-se bem, atuava em comédias, cantava no coro da igreja e participava de todos os festejos religiosos, inaugurações, bailes, piqueniques, sobressaindo-se dentre as irmãs, conquistando amizades, admiradores e cortejadores.
As suas reminiscências põem em relevo as peculiaridades da incipiente cidade, da sua comunidade formada por pessoas procedentes dos municípios vizinhos, das fazendas e sítios, instalados nas proximidades desde o período colonial; também o seu cotidiano em sua dinamicidade, contradições, pequenas intrigas e boatos, existentes até hoje. Após a década de 1920 quando a Vila de Pinheiro fora elevada à Cidade, fomentando a sua pecuária, lavoura, principalmente de arroz e algodão, incrementando seus engenhos, aumentando o extrativismo, de óleos vegetais como copaíba, rícino (carrapato), andiroba, gergelim e, de modo especial, de babaçu para aproveitamento no uso doméstico e exportação das amêndoas, tornou-se o Centro mais promissor da região, suscitando o interesse dos primeiros comerciantes dentre os quais José Paulo Alvim, que chegara ainda na década de 1910, instalando a sua farmácia, e que viria a desposar Inez em 1939. Também outros comerciantes, empresários, pequenos industriais, pároco, profissionais liberais como juiz, promotor público, coletor, fiscal, advogados, guarda-livros, professores, enfim dos primeiros funcionários públicos.
Com a abertura da Rua Nova e de outras ruas, a cidade se expandiu. Semanalmente chegavam vapores trazendo comerciantes, artesãos especializados, empresários, atraídos pelo franco progresso do
 Município. Vieram nessa época os primeiros estrangeiros, representados pelos portugueses das famílias Paiva, Gonçalves, Campos, Santos, Fernandes, Guimarães, Oliveira e outros, assim como sírio-libaneses das famílias Nagem, Aboud, Felix, Amate.
A chegada da iluminação elétrica, fora a pedra de toque para a instalação das primeiras máquinas de pilar arroz, engenhos movidos a eletricidade para fabricação de açúcar, melado e aguardente. Nas residências das pessoas de maior poder aquisitivo, as lamparinas e candeeiros foram substituidos pelas lâmpadas incandescentes.
A cidade crescia a olhos vistos, despertando o interesse de uma grande Companhia Francesa que instalou na chapada uma usina para beneficiamento do babaçu.
Os carpinteiros, ferreiros, pedreiros e mestres de obras aprendiam novas técnicas de construção, os beirais das casas antigas foram substituídas por modernas platibandas, plantaram-se mudas de palmeira imperial na praça da Matriz e as primeiras  figueiras em todas as praças e avenidas que constituem até os dias atuais o arcabouço da cidade. Data, também dessa década o início dos processos eletivos, quando os moradores domiciliados no município foram alistados, tornando-se aptos para votarem no primeiro prefeito e vereadores.
Era o desenvolvimento tão esperado pelos pinheirenses: tudo se transformava e Inez atenta, participava de tudo, talvez esperando, no subconsciente, estar ainda viva e lúcida, quase um século depois, para fazer este resgate histórico, como porta-voz dos acontecimentos do século XX, dando o seu depoimento e testemunho do processo de formação e desenvolvimento de nossa cidade.
Aos 100 anos, Inez, sempre de bem com a vida, que a dotou de excelente saúde e invejável constituição, continua vaidosa, mantendo os cabelos impecavelmente pintados, usando as suas preciosas bijuterias presenteadas por seus filhos, noras, genros, netos e amigos, em substituição às suas antigas jóias; fã de futebol, não perde uma partida televisionada do  time de sua torcida – o Flamengo – e, principalmente dos jogos das Copas. Lê bastante romances, jornais e as revistas Veja e Isto É, mantendo-se informada principalmente nos assuntos políticos.
Casou-se duas vezes com homens inteligentes e excepcionais, derrubando tabus e preconceitos. O primeiro esposo, foi o farmacêutico prático José Paulo Alvim, nosso pai, codoense, ainda solteirão aos 50 anos, benquisto e respeitado na cidade e circunvizinhanças onde se tornou referência na arte de manipular e cuidar da saúde dos pinheirenses, na ausência de médicos.
Quatros anos após a morte do seu companheiro de treze anos que lhe deixou três filhos, Aymoré e Moema, adolescentes, e José Paulo ainda criança, e uma farmácia bem montada para administrar e educar seus filhos, desposou um jovem poeta, Abílio da Silva Loureiro, natural de Balsas (MA), mas criado em Teresina. Orador vibrante, poeta e declamador que inscrito o seu nome nos anais de duas academias de letras que ajudou a fundar, tornando-se, após a sua morte, patrono de uma delas. Cidadão pinheirense foi, também, professor do Colégio Pinheirense e da Escola Comercial da ACREP e edil na Câmara Municipal de Pinheiro. Nomeia a Biblioteca do CAIC, para a qual contribuiu com dezenas de livros.
Com Abílio, Inez concebeu aos 47 anos, o seu filho caçula, Cleuber Cláudio, adotando, nessa mesma época, a sua filha Tatiana Gizeuda.
Inez viveu, cantou, encantou, dançou, amou, sofreu, chorou a perda de quase todos os seus entes queridos, casou duas vezes, enviuvou de ambos os maridos, mas não se deixou abater, nunca desanimou nem perdeu a alegria de viver. Decidida e dedicada trabalhou como comerciante durante 75 anos, interrompidos pela violência e impunidade que dominam todo o País.
Reconhecida pela cidade que ela ama e que a considera, foi homenageada pela Câmara Municipal como a comerciante em atividade, mais antiga de Pinheiro e no 150@ aniversário da cidade foi uma das cidadãs condecoradas pelo Prefeito Municipal Filuca Mendes, com a Comenda do Sesquicentenário Nessas mesmas comemorações foi representada em carro alegórico no desfile temático, que percorreu as principais ruas.
Por sua trajetória de mulher batalhadora, sempre pautada na decência e na integridade de caráter, por seu amor, desvelo, abnegação, acompanhando com dedicação a nossa educação, com pulso firme mas com muito carinho e por ser a nossa mãe é que orgulhosamente lhe prestamos esta homenagem, como preito da nossa gratidão: LONGA VIDA, MAMÃE, Salve! Viva, Inez dos Reis Castro.
          São Luis, 21 de janeiro de 2013
                                                                 

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013


PRIMÓRDIOS  DA  ARTE  DE CURAR  NO  MARANHÃO


Até algumas décadas atrás a História era circunscrita a um campo bem homogêneo, único, indiviso. Atualmente o campo historiográfico se divide em várias modalidades, fazendo com que os historiadores se organizem em espaços do saber, dividindo-os em campos, estes em domínios que são áreas de concentração em torno de certas temáticas e objetivos possíveis, usando para isso as mais diversas técnicas de abordagem.
Para o historiador atual não existe a exigência de um curso formal de História, desde que ele seja capacitado para aprofundar-se em algum campo que ele domine, produzindo excelentes e autênticos textos historiográficos.
Atrelada durante muito tempo à História das Ciências, a Medicina de alguns anos para cá,  graças à dedicação de vários grupos de médicos, os quais, sem perder de vista o conhecimento mais geral da Medicina, desdobraram-na em vários domínios, entrelaçados, abrindo espaço para várias especialidades dentro do saber histórico. Inicialmente só a História das Doenças, da Clínica, hoje uma profusão de domínios, dimensões, criando uma rede de modalidades, possivelmente exigidos pela necessidade de elaborar teses e orientar monografias imprescindíveis para o bom desempenho de pesquisadores e mestres.
Assim surgiram grupos de médicos especializados, sequiosos em aprofundarem e organizarem seus conhecimentos nos domínios das epidemias que grassavam no Brasil Colonial, as portas de entrada dessas doenças, as primeiras campanhas de vacinação, abertura dos primeiros hospitais, médicos pioneiros nos mais diversos campos da Medicina, o estudo das chamadas doenças tropicais, as primeiras técnicas cirúrgicas empregadas, origem de certas doenças como a esquistossomose, as filarioses, a bouba, o calazar, a hanseníase, a febre amarela, a tuberculose, a sífilis, as micoses e uma gama grande de viroses.
Aqui no Maranhão essa iniciativa partiu do Prof. Aymoré de Castro Alvim, ao fundar a Sociedade Maranhense de História da Medicina, que aglutina médicos especializados em suas áreas de atuação, interessados em preencher essa lacuna, em relação ao nosso Estado. Pesquisando as poucas fontes a que teve acesso, o Prof. Aymoré procurou determinar a época em que a Medicina, como ciência, começou a ser exercida entre nós, concluindo sem sombra de dúvidas, que o primeiro médico a pisar o território maranhense fora o Dr. Thomas de Lastre, francês, que acompanhava a expedição comandada por Daniel de La Touche, em 1612. Filho de médico e formado pela Universidade de Paris, o Dr. De Lastre trocou correspondência com o seu pai, porém não deixou registros de doenças entre nossos aborígenes, provavelmente por ser médico-cirurgião, adestrado aos tratamentos de traumas de soldados nos campos de batalha – um cirurgião militar. Por essa época, a Medicina na França, embora exercida por médicos de campo, freiras católicas e cirurgiões barbeiros, dera um grande salto, graças às técnicas introduzidas por Ambroise Paré, cirurgião-barbeiro, considerado o Pai da Medicina Francesa. Na verdade não era formado em Medicina, porém introduziu técnicas que tiveram grande êxito, tanto na Cirurgia como na Clínica. Pelos seus conhecimentos e dedicação foi médico de três soberanos: Henrique II, Francisco II e Charles IX. A ele se atribui a primeira cirurgia de hérnia estrangulada.
Após a expulsão dos invasores franceses, em quase dois séculos de colonização e povoamento, os únicos físicos conhecidos pelos colonos e índios foram os jesuítas que utilizavam uma terapêutica empírica e profilaxia rudimentar, fugindo do curandeirismo, pela cultura humanística que possuíam, a mais alta nesse tempo. Os índios com a sua mentalidade primitiva exigiam curas milagrosas, como se os religiosos por eles chamados Poçangas, tivessem o verdadeiro poder sobre a vida e a morte. Em cada missionário podia dizer-se que existia um médico, pois as circunstâncias lhes impunham o dever humanitário de acudir as enfermidades do corpo, na medida que lhes era possível, valendo-se das ervas medicinais locais e da pequena botica do convento.
Nessa época, as doenças consideradas comuns entre os índios, portanto autóctones, eram as febres palúdicas, micoses, reumatismos, asma. As doenças que praticamente dizimaram os povos ameríndios foram trazidas pelos europeus, mais tarde pelos asiáticos e africanos: bouba, varíola, peste bubônica, febre amarela, tuberculose, cólera morbus, sarampo, caxumba, hanseníase, foram algumas das moléstias adquiridas pelos índios em contato com o branco civilizador, pois segundo alguns visitantes, os nossos índios eram considerados sadios, imunes mesmo às epidemias que se alastravam no litoral, do Pará ao Rio de Janeiro.
Alguns visitantes, deslumbrados pelas belezas luxuriantes de nossas florestas, alguns trazidos pelo gosto da aventura da viagem, exotismo de nossa fauna e flora, poucos vestígios deixaram. Entretanto os capuchinhos Yves dÈvreux e Claude dÀbeville no início do século XVII e mais tarde alguns naturalistas que fizeram parte de expedições científicas, no Império, como os pesquisadores Von Martius e Spix descreveram algumas das doenças que viriam a tornar-se endêmicas entre nós.
                                              São Luís – Maranhão
                             Moema de Castro Alvim

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Porque DIAMANTE


O nome  diamante deriva-se de antigo termo grego que significa invencível. Constituido de carbono puro possui a mais compacta disposição de átomos sendo, por conseguinte, a substância mais pura e a mais dura que se conhece na natureza, não sendo afetada pelo calor e nem pela ação dos ácidos e dos álcalis. Extremamente belo e famoso pelo seu jogo de cores, quando exposto à luz, emite cores diferentes que vão do incolor, passando pelo amarelo, laranja, vermelho, marron, verde, azul.
  
Essência do brilho retrata a energia espiritual em sua forma mais pura, é força se manifestando como forma, vontade como idéia, o ser manifestando-se como mundo, símbolo do imutável e do inalterável, da clarividência e da luminosidade. Representa a energia criadora do Homem. 

Os alquimistas acreditavam que o diamante, pela sua beleza fulgurante e encantadora, alcançara o auge da beleza e da perfeição. 

Quando lapidado é conhecido pelo nome de brilhante, pedra deslumbrante e preciosa, de beleza incomparável, irradiando faixas multicoloridas à sua volta. Desde tempos imemoriais, seu simbolismo é representativo da imortalidade e da absoluta espiritualidade. 

O diamante foi por nós escolhido para representar AYMORÉ, não só pelo significado simbólico, nem pelo seu alto valor comercial, tampouco por estar associado aos nascidos sob o signo de Touro e sim, por ser depois de lapidado, multifacetado, tal como a trajetória de vida do homenageado que já desempenhou as mais diversas funções, ocupando os mais variados cargos, exercendo incontáveis atividades, sempre com brilho, competência, ética, transparência, iluminando a todos que têm o privilégio de gravitar em torno dele.

domingo, 6 de janeiro de 2013

MEU 70° ANIVERSÁRIO




Há pessoas que colecionam objetos, alguns de pouco valor, como chaveiros, canetas, canecas de cerveja; outras colecionam selos, livros, discos, revistas e há outras cujos objetos valorizam-se muito com o passar do tempo, como pinturas, esculturas, obras de arte, enfim.
Ao longo desses setenta anos passados, esforcei-me para conquistar e colecionar amigos, por onde passei: no Rio, em Belo Horizonte, Brasília e claro em Pinheiro onde nasci e vivi os primeiros dezesseis anos de vida e em São Luís onde graduei-me em Farmácia e voltei anos depois para trabalhar na Secretaria Estadual de Saúde e na Universidade Federal do Maranhão onde servi por 25 anos; no Laboratório Gaspar onde trabalhei durante dois anos para o meu colega de turma, compadre e amigo até hoje, Antônio Pinheiro Gaspar. Após a aposentadoria estabeleci-me como proprietária do sebo Papiros do Egito, onde mais faço conhecimentos do que vendas.
Tenho amigos dentre pessoas simples e até poderosas (bota poder nisso!), de todas as classes sociais, de todos os credos, etnias, idades, sexos, profissões, ocupações. Amigos antigos de quase 60 anos e amigos recentes; reais e virtuais, próximos e distantes. Alguns não vejo há 40, 50 anos, mas quando nos encontramos é como se nos tivéssemos visto no dia anterior e o papo flui espontâneo, como se o hiato não existisse.
                 Eu sou uma colecionadora de amigos. Na passagem do 70° aniversário natalício, o meu marido, Fransoufer, ofereceu-me um jantar para 100 convidados e que foi transformado num evento de Solidariedade aos adictos da Fazenda do Amor Misericordioso que se dedica, através do Pe. João Luiz Mancini a reabilitá-los das drogas e dar-lhes uma esperança de vida.
Para isso convoquei os amigos. Gostaria de convidar muito mais, mas o orçamento só chegava a 100. Além dos amigos, tenho muitos primos, filhos dos primos e até seus netos, todos de minha estima e consideração. Só deu para convidar um pequeno número de pessoas representativas dos vários grupos sociais, intelectuais aos quais pertenço e outros envolvidos com a causa em pauta (psiquiatras, psicólogos, terapeutas, sociólogos, assistentes sociais, enfermeiras, farmacêuticos, dentistas, membros de Pastorais da Sobriedade, das Comunidades Terapêuticas, empresários do ramo da Medicina e outros que já ajudam, há tempos, na manutenção da Fazenda).
E as doações foram levadas ao restaurante, outras levadas à minha casa e no meu sebo. Há dois dias que separamos, em caixas, as roupas de cama, toalhas de banho e rosto, camisetas, bermudas, cuecas, artigos de toalete, sandálias e cestas básicas. Já enchemos 12 caixas que serão recebidas com satisfação pelos residentes da Fazenda. O meu pedido encontrou eco no coração dos meus amigos e todos colaboraram com alegria e amor.
A surpresa da festa ficou por conta da chegada do meu filho o qual não via há vários meses, pois ele reside em Fortaleza, trabalhando num Centro de Recuperação de Dependentes Químicos. Ao descer do automóvel em frente ao Restaurante Maracangalha, ele acompanhado de dez amigos, suas esposas, noivas e namoradas, estavam me esperando e me recepcionaram com flores e outras homenagens.
Devo esclarecer que o meu filho, também, é um colecionador de amigos. Ele tem amigos recentes, pupilos, mas é fiel, leal aos companheiros da adolescência. E sei que todos o amam, assim como seus familiares, que sempre o trataram com distinção e solicitude.
Tenho problemas? Sim, como todo mundo. Momentos de desânimo, de desespero, de angustia? Sim, mas não esmoreço, não cultivo ódios, nem rancores, nem inimizades. Acreditem, mesmo levando uma vida sem glamour e aparentemente simples, sou felicíssima e sabem por que? Porque nunca ambicionei o que não podia obter; nunca tive inveja; nunca cobicei nada e nem desejei ter a vida que outras pessoas levam. Nunca competi, nem concorri sequer por cargos que ocupei. Questão de valores? Conformismo?
Muitas amigas me perguntam: “por que não viajas para o exterior, para conheceres outras culturas, na Europa, Estados Unidos e outros países dos outros continentes, para conhecer o berço da nossa civilização?”
Mas qual é mesmo o berço da civilização? Qual é mesmo a minha origem? Por que assumir culturas adventícias, se lá no âmago do meu ser, no inconsciente e culturas herdadas dos meus ancestrais africanos e indígenas, eu tenho a certeza de que nada em comum eu tenho com os nossos colonizadores europeus que impuseram os seus costumes, a sua religião, a sua língua, a sua história, os seus heróis, os seus valores? Eu não posso correr  atrás de raízes que não são as minhas.
A história da nossa família começou a ser tecida com a união do meu pai, descendente de africanos, com a minha mãe, descendente de índios. A partir daí que começa o meu interesse e dos meus irmãos para construir a nossa história, com as nossas aspirações simples, prosaicas, mas autênticas.
Sabem os meus sonhos, os meus desejos, os meus ícones, desde que comecei a valorizar o trabalho do meu pai? Conhecer os templos da Ciência, aqui no Brasil, onde homens abnegados, cientistas que pesquisaram, descobriram e identificaram os agentes etiológicos das doenças que continuam a dizimar milhões de brasileiros por ano; seus transmissores e as medidas preventivas para combatê-los e tratar os enfermos. E isso eu consegui: pisei solos sagrados, conheci laboratórios, bibliotecas freqüentadas pelos cientistas mais famosos do Brasil: Oswaldo Cruz, Carlos Chagas e seu filho Evandro Chagas, Adolfo Lutz, Belisário Penna, Helion Póvoa, José Pelegrino, Frederico Simões Barbosa, Vladimir Lobato Paraense, Otto Bier, Jayme Neves, Amílcar Viana, Aluísio Prata, Eduardo Alencar, Zigman Brenner, Ricardo Veronesi, Manuel Abreu, Samuel Pessoa, o casal Deane, e muitos outros sábios, grandes expoentes da Pesquisa em Parasitologia no Brasil. Alguns conheci pessoalmente e cheguei a trabalhar em seus laboratórios, a manusear os seus livros, no Instituto Oswaldo Cruz, em Manguinhos, no Instituto Adolpho Lutz em São Paulo, no Instituto Renée Rachou, em Belo Horizonte e durante dois anos estagiei no Centro Internacional de Identificação de Caramujos, em Brasília.
Amigos, agradeço a presença de todos vocês  que vieram nesta noite trazer-me o seu abraço de parabéns e, principalmente porque atenderam ao meu apelo para ajudar a Fazenda do Amor Misericordioso que ajuda dependentes químicos a lutar contra a compulsão pelas drogas ilícitas e pelo alcoolismo. Referida instituição fora pensada em 2003, face à difícil e trágica realidade da adicção química, à dor de centenas de famílias envolvidas como co-dependentes, iniciando-se com um pequeno grupo de pessoas que se dispunham a oferecer apoio aos que acorriam em busca de ajuda. Em 2005, com a organização da Pastoral da Sobriedade e a colaboração de entidades estrangeiras italianas e alemães, a Diocese de Pinheiro adquirira, no povoado de Ponta de Santana, um pequeno sítio onde fora instalada um Centro, sob a coordenação do Pe. João Luiz Mancini, para acolher e propiciar um programa de recuperação aos adictos.
O Programa se desenvolve através da profunda espiritualidade à luz da Palavra de Deus, pela laborterapia rural que também auxilia na desintoxicação, assistência psicológica, atividades educacionais, culturais, esportivas e grupos de mútua ajuda. O período de permanência na Fazenda é de nove meses, onde é oferecida uma educação integral para uma vida a ser vivida na sobriedade.  É a gestação de uma nova vida! São 50 os internos. O tratamento é gratuito, pois poucas famílias têm condições para ajudar financeiramente a manutenção da Fazenda. O Programa também propicia aos familiares, acompanhamento e orientação, através de reuniões semanais e visitas familiares feitas pelos membros da Pastoral da Sobriedade, além de um trabalho de prevenção com palestras, visitas programadas à instituição com apresentação de testemunhos dados pelos internos.
Amigos, geralmente na data do nosso aniversário natalício, damos uma paradinha no corre-corre diário, para fazermos uma reflexão que nos leve a ter consciência do tempo em que tecemos a nossa história e nos construímos. Na consciência do fluir da nossa temporalidade, na certeza da nossa finitude, nos questionamos sobre o nosso viver, suas verdades e mentiras, as alegrias e as tristezas, os erros e os acertos, nossas boas e más ações. E esta possibilidade se torna mais freqüente quando atingimos a meia-idade. Quando ultrapassamos os 70 anos, como é o meu caso, passamos a buscar o sentido da vida, questionando-nos se a nossa caminhada existencial fora útil ou inócua, exitosa ou um fracasso. Fazemos um balanço do que recebemos e, principalmente do que demos; se nos capacitamos para a tarefa fundamental de amar e de servir, uma vez que só nos pertence o que ofertamos.Enfim, estamos aqui de passagem e o único passaporte que levaremos é o das nossas ofertas, das nossas doações.
No inventário deste ano constatei que fui bem aquinhoada ao longo de toda a minha vida, pois mais recebi do que dei: sou de um lar harmonioso, de uma família unida e amorosa; tive um pai exemplar e ainda tenho uma mãe maravilhosa; filho, neto e marido que me amam; irmãos, cunhados, sobrinhos inexcedíveis e colegas que me consideram e me estimam. Realizei-me profissionalmente, pois tive o privilégio de trabalhar com ensino e pesquisa que me apaixonaram. Após a aposentadoria optei pela companhia instrutiva e silenciosa de milhares de livros, parceiros desde a infância.
E o que dei em troca de tantas dádivas? Como retribuir tantas benesses, algumas recebidas, talvez imerecidamente?
Esta iniciativa que vocês estão me ajudando a concretizar, talvez seja um pequeno e tímido passo para o início dessa retribuição, ajudando-me a crescer como pessoa, para tornar-me digna da sua amizade.
Falamos, comentamos, discutimos, postamos na Internet, às vezes sabemos até dados estatísticos, coeficientes, previsões sobre calamidades e epidemias que nos assolam, assim como sobre catástrofes ocorridas em regiões longínquas, das quais não sabemos nem pronunciar-lhes o nome, mas quando o assunto é tóxico, saimos pela tangente, desconversamos e o que sabemos é só o que os meios de comunicação nos servem desde o café da manhã.
Quantos de nós, aqui presentes, com exceção dos especialistas da área, sabemos a extensão desse flagelo que está abalando os alicerces da nossa civilização, que esgarça o nosso tecido social, que degrada física e moralmente toda uma geração de jovens, sabotando-lhes seu futuro, roubando-lhes seus sonhos e esperanças, minando-lhes a sua confiança, abreviando-lhes a sua vida? Quantos de nós, leigos, estamos aptos para avaliar a extensão dos danos mentais e a dependência química causadas pelas drogas – a toxicofilia?
Há algum tempo lemos em matéria de capa da revista Veja, uma das mais conceituadas do país, reportagem sobre drogas, alertando que a questão não é saber se um jovem vai experimentá-las, mas quando o fará.
Dos festivais de rock aos combatentes de guerras, dos guetos periféricos a certas seitas religiosas; dos morros, das favelas, das invasões às portas das escolas e universidades, aos estacionamentos de shoppings, às boates, aos barzinhos, às micaretas, às raves, enfim, nas baladas freqüentadas por nossos filhos, elas estão à espreita a rondá-los, assediando-os sorrateiramente, insidiosamente, insistentemente.
Somente quando elas adentram nossos lares, desestruturando as nossas famílias, solapando as nossas economias, tornando-nos coniventes e cúmplices, pelas tentativas equivocadas para protegê-los, pela vergonha, desinformação e adiamento na procura de ajuda profissional é que despertamos para o problema.
E o que fazemos? Recolhemo-nos em nossa concha de culpa e auto-comiseração, apavorados, desarvorados, impotentes, com receio que os nossos vizinhos, parentes e amigos descubram. Ficamos mais preocupados com o preconceito, a discriminação do que com o horror vivido pelos nossos filhos que, escravizados pelo vício, não conseguem sozinhos encontrar o caminho de volta, pois em muitos casos é um caminho sem retorno, um túnel sem saída.
Não os estigmatizemos como drogados e viciados; não os tipifiquemos como marginais e delinqüentes; não os rotulemos como maconheiros, diambeiros, vadios, degenerados e outros epítetos, pois difundir o preconceito, atrelado à ignorância, dificultará a implantação das medidas de prevenção, retardando, outrossim, a busca pelo tratamento.
Considerada doença pela OMS perfeitamente controlável, causa perplexidade a indiferença, negligência, incompetência e descompromisso das sociedades e dos governos, frente a um problema de tal dimensão, de tanta gravidade, de tantas conseqüências.
Se as drogas se tornaram onipresentes, passaram sim, a ser problema de Saúde Pública, afetando não só os adictos e seus familiares, mas os usuários e toda a sociedade que tem se mostrado omissa, indiferente, egoísta, injusta.
Façamos nossas as palavras do Papa João Paulo II: a droga é um mal e como todo mal deverá ser combatido.
E essa guerra não pode ser perdida! Todas as frentes educacionais, terapêuticas, bem como todas as associações religiosas, filantrópicas deverão unir-se para combater essa pandemia que está levando a humanidade ao holocausto, à auto-destruição.
Finalizando, conclamo os amigos presentes a tomarem parte nessa cruzada contra as drogas, não com contatos físicos com os dependentes ou com os seus familiares, mas ajudando-os anonimamente, através das Pastorais da Sobriedade ligadas às Comunidades Terapêuticas que os reabilitam como seres humanos e sociais que são, resgatando-lhes a auto-estima, a sua dignidade e respeito como cidadãos, pela reinserção social, com a reintegração no mercado de trabalho.
Lembremo-nos que a guerra para os já atingidos, mesmo reabilitados não termina. As suas batalhas contra a compulsão são diárias, sofridas, dolorosas, lutando para vencerem um dia de cada vez, durante toda a sua vida.
Obrigada pela presença e solidariedade de todos vocês. por hoje!