I
– O maracujá
O maracujá pertence
à família dos Passifloriaceae, com
14 gêneros e cerca de 580 espécies já descritas. As espécies mais comunas entre
nós são a Passiflora edulis (roxo) P. flavicarpa (amarelo)
e o P. alata ou maracujazinho.
Foi um dos frutos descritos e desenhados pelo
Frei Cristóvão de Lisboa em sua História dos Animais e Árvores do Maranhão,
elaborada entre 1624-35, época em que aqui viveu. No Brasil, a primeira
referência ao maracujá data de 1587, na
obra Tratado Descritivo do Brasil. Entretanto, em 1569, Monardis descrevera as
primeiras espécies do gênero Passiflora.
Planta nativa das regiões tropicais e
subtropicais das Américas, tipo trepadeira, cresce espontaneamente. Já foram
descritas mais de 150 espécies no Brasil, no Caribe e na Flórida. Conhecida
pelos índios com o nome de mara kuya (comida dentro da cuia) é umas das
quatro espécies de frutas nativas dentre as vinte preferidas pelos brasileiros.
Atualmente está
sendo cultivada nos Estados Unidos, no Havaí, na Austrália, no Quênia, no
Ceilão e na Europa. O seu tamanho, forma e cor variam: arredondados, pequenos, médios,
ovalados, cor arroxeado ou amarelo, grande, como a espécie Passiflora macrocarpa ou
maracujá-melão, usado na preparação de compotas. A espécie P.alata ou maracujá
doce vem sendo cultivada pela Embrapa, com grande
aceitação no mercado mundial. Pode ser comido in natura. Seus frutos são
alaranjados, folhas grandes em forma de coração e flores avermelhadas. As
demais espécies, são usadas, no nosso dia-a-dia, em sucos, sorvetes, cremes,
gelatinas, pudins, mousses, bolos, doces cristalizados, licores. Também, na
indústria de cosméticos, em produtos para pele e cabelos e na fabricação de
perfumes. As espécies de casca enrugada têm a polpa mais doce do que os frutos
de casca lisa.
O Brasil destaca-se
como primeiro produtor mundial do maracujá e um dos principais exportadores de
suco, ao lado da Colômbia e do Equador.
A sua polpa é rica
em betacaroteno e possui grande teor de minerais.
Cem gramas de maracujá
fornecem 54,60kcal. Água 85,50g); carbohidratos (9,60g); Lipídios 1,80g);
Fósforo (71,00mg); Cálcio (53,00mg); Ferro (1,27mg), além de Vitaminas A
(caroteno) C (ácido ascórbico) e do Complexo B (B1, B2 e B5).Também apresenta
nas folhas Vit B2 (riboflavina) e Vit. PP (ácido nicotínico)
PROPRIEDADES MEDICINAIS
As cascas
dessecadas e trituradas, são ricas em pectina, que funciona como bloqueador de gorduras,
reduzindo e baixando as taxas de glicose no sangue e eliminando as toxinas.
Também apresenta Vit. B3 que melhora a ansiedade, ajuda o crescimento e protege
as paredes do estômago. Combate o colesterol..
A polpa é usada na
medicina popular como sedativo e tranquilizante. Essas propriedades foram, no
entanto, encontradas somente em folhas dessecadas, em 1867, pelo Dr. Phares. Em
1904, Stapleton utilizou-as para tratamento clínico da insônia, tendo boa
aceitação, até meados do século passado, em preparações à base de extrato
aquoso ou alcoólico.
As vitaminas da
polpa, principalmente a Vit.C fortalecem
o sistema imunológico, além de poderoso anti-oxidante que previne o
aparecimento de radicais livres, retardando o envelhecimento.
As sementes, em
grande número, podem ser utilizadas como vermífugas e misturadas com a farinha
das cascas dessecadas e pulverizadas, podem ser processadas para fabricação de
rações, adubos, óleo comestível.
A raiz apresenta
propriedades emenagogas e adstringentes, também usadas como anti-inflamatório
cutâneo.
As folhas
dessecadas em temperatura ambiente, tem largo emprego na medicina popular,
usadas nas diarreias e hemorroidas, com propriedades sudoríficas e soníferas, sob a forma de decoctos.
Em banhos quentes é
usada no tratamento da gota e erisipela, macerando-as para cataplasmas.
Cicatrizantes.
A Farmacopeia
Brasileira incluiu o maracujá, como planta medicinal, desde 1929, retirando-o
na segunda edição (1959) e voltando a considera-lo a partir de 1977.
Em experimentos
conduzidos por pesquisadores da Universidade do Rio Grande do Norte, em 1978,
foi detectado, em extrato aquoso das folhas, um princípio ativo, de natureza
proteica, com perfil semelhante a dos tranquilizantes. Age como depressor do
sistema nervoso central (SNC), induzindo modificações como: prolongamento do
sono barbitúrico, redução da temperatura do corpo, potencializando outros
depressores como a morfina e bloqueando parcialmente o efeito estimulante das
anfetaminas Em outras palavras, as folhas e raizes possuem maracujina, passiflorina
e calmofilase, com propriedades sedativas
e anti ansiolíticas, recomendadas como coadjuvante no tratamento de dependência
química, na luta contra a compulsão das drogas. Também atuam como soníferas,
anti-espasmódicas, anti-inflamatórias e depurativas. Combatem a fadiga,
desacelera o coração e dilata os vasos sanguíneos, melhorando a circulação do
cérebro, aliviando dores de cabeça e cólicas
.
CURIOSIDADES SOBRE O MARACUJÁ
As flores do
maracujazeiro têm aspecto bonito, abrindo-se a partir do meio-dia e fechando-se
à noite. São hermafroditas e possuem abundante néctar, ocorrendo a fecundação
quando uma flor de uma planta é fecundada com o pólen de outra. A esse fenômeno
biológico denomina-se autoincompatibilidade. Somente as mamangavas ou abelhonas
silvestres do gênero Xulocopa, são responsáveis pela
polinização.
Conhecidas como flor da paixão Segundo o
folclore durante a crucificação de Jesus, o sangue escorrido do seu corpo teria
molhado uma planta que estava aos pés da cruz. Essa planta nunca dera flor, mas
após essa rega soltou um botão que virou uma flor, significando a Paixão de
Cristo: seus estigmas em número de três, assemelham-se aos cravos; as cinco
antenas, simbolizam as chagas, as gavinhas, os açoites. O formato da flor, a
imagem da coroa de espinhos; a cor roxa, o sangue derramado. O fruto,
arredondado simboliza o pecado.
O Papa Paulo V, no
século XVII ordenou o cultivo do maracujazeiro, em Roma, por acreditar que sua
flor representava uma revelação divina.
Câmara Cascudo cita
muitos viajantes que por aqui passaram e registraram a presença do maracujá,
como o naturalista MacGrave e o frade Claude dAbbeville.
Cantada em verso e
prosa, tornou-se famosa na voz de Gal Costa. Rolando Boldrin, declama uma
poesia A flor do maracujá, associando-a à paixão de Jesus. Há, também um poema
de Caramuru sobre essa planta.
Outro dado
interessante que encontrei em minhas pesquisas é relacionado aos pajés que ao
serem iniciados nas superstições abstinham-se dos frutos do maracujazeiro.No município de São José de Ribamar há uns 2 anos, começaram a crescer num maracujazeiro, frutos parecidos com pênis. Grande atração turística, com o tempo, murchou e morreu.
II – A PEDRADA
Uma das condições
para a permanência de uma doméstica em nossa casa, dependia da sua criatividade
em contar estórias, modificando-as a cada relato. As minhas preferidas eram as
de Pedro Malasarte, do macaco e do coelho, de João e Maria perdidos na floresta
e guiando-se pela trilha de pedrinhas. Não cansávamos de ouvir as mesmas
estórias, entremeadas por casos de visagens e outros fenômenos extraordinários.
Adorava ouvir contar sobre a Pedra de Itacolomy que crescia de ano pra ano.
Nesse ítem,
Dionísia, do município de Bequimão bateu o recorde, acrescentando cada dia mais
detalhes. Foi ela quem me ensinou a dançar ao som dos baiões de Luiz Gonzaga:
“Bate a enxada no chão, limpa o pé de algodão...”. Dois passos pra cá, dois pra
lá.
A segunda condição
era que soubesse bater ovos muito bem. Esse era um dos nossos lanches (merenda
nesse tempo) preferidos: ovos batidos com um pouco de açúcar, farinha seca e calda de maracujá, passada no crivo. Não era
qualquer pessoa que sabia fazê-los. Havia uma ciência para ficar ao nosso gosto:
as claras deviam ser batidas quase em ponto de neve, com uma casquinha de limão
e só depois acrescentavam-se as gemas, batendo-as, à medida que eram colocados
os outros ingredientes.
Outras merendas
eram: queijo de São Bento com goiabada caseira, macaxeira cozida com mel de
cana e banana cacau assada, com um pouco
de manteiga e pulverizada com açúcar e canela e frutas da época.
Certa tarde desejei
comer uns ovos batidos, mas cadê os maracujás? Não havia nenhum em casa, o que
me levou a obtê-los na fonte: o telhado da cozinha da Vila Moema. Como todos
sabem o maracujazeiro é uma trepadeira, precisando de apoio para
desenvolver-se. Esse a que me refiro nascera no quintal do tio Paulo e
esparramou-se pelo telhado de nossa propriedade. O nosso tio morava num sobrado
de esquina, pegado à nossa casa, ocupando com a sua grande família (dez filhos)
o piso superior. No térreo funcionava o Bar Vitória, com seus bilhares que
atraiam os rapazes, sorvetes (o imperial, inesquecível!), picolés, artigos de
mercearia e os famosos gelados. Estes eram refrescos, geralmente de maracujá,
cupuaçu e tamarindo colhido em seu próprio quintal, tomados com fatias de bolo
feito por d. Naiza, sua esposa. Provavelmente o maracujazeiro nascera de
sementes jogadas no quintal, após macerar as frutas com a ajuda de um crivo, em
época anterior a liquidificador.
Quando tinha esses
desejos nada conseguia freá-los e resolví subir no telhado para conseguir
alguns frutos. Aos 9 anos trepava em todas as fruteiras do nosso quintal e
ainda escalava telhados. Calmamente escolhia os maracujás maduros quando percebí que alguém
jogara uma pedra. Aymoré que não era hábil nem em escaladas nem bom de
pontaria, não atingiu o alvo, a mando de papai, para espantar-me. A segunda me
pegou em cheio, atingindo o espaço entre as sobrancelhas. Assustada e com o
rosto coberto de sangue, descí do telhado, no maior berreiro. Enquanto mamãe
limpava o ferimento e punha mercúrio cromo, papai dava uma surra no mano, com
um rebenque, para uso exclusivo nessas situações. Papai zangado batia e lhe
falava: “seu corão de merda eu não mandei ferir tua irmã”. Enquanto ele
apanhava eu não sabia se chorava de dor ou se ria da sova que ele levava.
Continuo gostando
de maracujás, cultivados por mim, em 3 sítios que possuí e agora em minha casa
no Sítio Leal, para fazer chá das folhas nas minhas noites insones. No entanto
eu gosto mais da espécie silvestre. Sim, ainda tenho a cicatriz, mas não guardo
o menor resquício de rancor do mano Aymoré.
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